"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



15/01/2016

A restrição dos meios de prova nos embargos de executado: um novo enquadramento sistemático


O art. 729.º, al. g) 1.ª parte, CPC admite que o executado possa invocar, nos embargos que deduza na execução, qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação exequenda, desde que:

-- O facto seja posterior ao encerramento da discussão em 1.ª instância;

-- A prova do facto possa ser realizada através de documentos.

A exigência da superveniência do facto em relação ao encerramento da discussão em 1.ª instância não é problemática. Esse é o momento que marca a referência temporal do caso julgado: por um lado, as partes têm o ónus de invocar até esse momento os factos supervenientes que sejam relevantes para a apreciação da causa (cf. art. 588.º, n.º 3, al. c), e 611.º, n.º 1, CPC) e, por outro, no sistema processual civil português, as partes não podem alegar (em recurso) nenhuns factos supervenientes que ocorram depois desse momento.

Em contrapartida, a exigência da prova documental (apesar de antiga: cf. art. 911.º, n,º 8, CPC/1876) é tudo menos problemática (ressalvados, naturalmente, os casos em que a lei exige um determinado meio para a prova de certos factos). A questão deve ser hoje repensada à luz do disposto no (novo) art. 732.º, n.º 5, CPC quanto ao valor de caso julgado da decisão proferida nos embargos de executado.

Este preceito estabelece que "a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda". Embora seja necessário algum apoio teórico para justificar que do não reconhecimento do facto modificativo ou extintivo resulte um caso julgado sobre a existência, a validade e a exigibilidade do crédito exequendo (problemática que que agora não importa considerar), o que é certo é que o preceito determina que, se os embargos forem julgados improcedentes, se forma caso julgado material sobre essa existência, validade ou exigibilidade.

Este efeito de caso julgado é susceptível de fundamentar a excepção de caso julgado (nomeadamente, em execuções posteriores de outras parcelas ou prestações do mesmo crédito), pelo que há que considerar que é incompatível com qualquer restrição desrazoável dos meios de prova que executado pode utilizar na oposição à execução. Não pode ser aceitável que a lei atribua valor de caso julgado material à decisão de improcedência dos embargos (isto é, a uma decisão de mérito desfavorável ao executado embargante) e, ao mesmo tempo, restrinja os meios de prova de que este executado se pode servir na oposição à execução.

MTS