Conversão de arresto em penhora; inoponibilidade de actos posteriores;
âmbito temporal da conversão; âmbito subjectivo da conversão
1. Cass. Civ., sez. VI, Ord., 7 gennaio 2016, n. 54, entendeu que a conversão do arresto em penhora não tem eficácia retroactiva, pelo que a hipoteca constituída depois do decretamento do arresto é oponivel ao credor arrestante (como consequência do próprio arresto), mas não aos credores que reclamaram os seus créditos na execução (cf. Il Quotidiano Giuridico).
2. Deixam-se as seguintes notas:
-- A solução parece dever ser a mesma no direito português; é verdade que, se a penhora tiver resultado da conversão de um arresto anterior, a anterioridade da penhora se reporta à data do arresto (art. 822.º, n.º 2, CC); no entanto, o arresto obtido por um credor só pode beneficiar esse mesmo credor, pelo que a inoponibilidade dos actos de disposição posteriores ao arresto (cf. art. 622.º, n.º 1, CC) não pode beneficiar outros credores; noutros termos: a conversão do arresto em penhora faz retroagir a data da penhora à data do arresto, mas desta retroactividade apenas pode beneficiar o credor arrestante;
-- Ao contrário do que, algo frequentemente se afirma, o arresto não é um direito real de garantia, dado que os seus efeitos nada têm em comum com aqueles que são típicos desses direitos; aliás, se o arresto fosse um direito real de garantia, então a penhora -- que produz efeitos (de inoponibilidade) semelhantes aos do arresto (cf. art. 819.º a 821.º CC) -- também teria de ser um direito real de garantia;
-- Historicamente considerado, há que distinguir entre o arresto de base (estritamente) germânica e o arresto de base italiana (ou, mais especificamente, lombarda):
(i) o arresto de base germânica tinha uma função essencialmente executiva, quer sobre a pessoa do devedor, quer sobre o seu património, pois que estava fundamentalmente orientado para a satisfação do credor (cf. Kisch, Der deutsche Arrestprozess (1914), 12 ss.; Planitz, Grundlagen des deutschen Arrestprozesses (1922), 69 ss.); é esta a origem do entendimento do arresto como uma "execução antecipada" (cf. Güthe, ZZP 24 (1898), 346 ss. e 365 ss.);
(ii) o arresto de origem italiana orientava-se fundamentalmente para atribuir ao credor uma garantia para o seu crédito através de um processo sumário (cf, Wach, Der Arrestprozess in seiner geschichtlichen Entwicklung I (1868), 72 ss.).
É curioso verificar que ainda foi a ideia de antecipação de execução que levou o legislador da ZPO alemã (de 1877) a incluir o regime do arresto no livro respeitante à execução (onde ainda hoje permanece: § 916 a § 934). Também é interessante constatar que, na versão originária do CPC/1961, ainda se regulava um arresto contra tesoureiros, recebedores ou devedores do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, no qual se permitia que o Ministério Público, além de requerer o arresto, requeresse a prisão do responsável (art. 410.º, n.º 1, CPC/1961).
Em contrapartida, é possível encontrar uma linha de continuidade entre a função de garantia do arresto e a possibilidade da sua conversão em penhora. Já no art. 832.º CPC/1876 se estabelecia o seguinte: "Havendo bens arrestados, o auto de arresto substituirá a penhora para todos os efeitos".
MTS
2. Deixam-se as seguintes notas:
-- A solução parece dever ser a mesma no direito português; é verdade que, se a penhora tiver resultado da conversão de um arresto anterior, a anterioridade da penhora se reporta à data do arresto (art. 822.º, n.º 2, CC); no entanto, o arresto obtido por um credor só pode beneficiar esse mesmo credor, pelo que a inoponibilidade dos actos de disposição posteriores ao arresto (cf. art. 622.º, n.º 1, CC) não pode beneficiar outros credores; noutros termos: a conversão do arresto em penhora faz retroagir a data da penhora à data do arresto, mas desta retroactividade apenas pode beneficiar o credor arrestante;
-- Ao contrário do que, algo frequentemente se afirma, o arresto não é um direito real de garantia, dado que os seus efeitos nada têm em comum com aqueles que são típicos desses direitos; aliás, se o arresto fosse um direito real de garantia, então a penhora -- que produz efeitos (de inoponibilidade) semelhantes aos do arresto (cf. art. 819.º a 821.º CC) -- também teria de ser um direito real de garantia;
-- Historicamente considerado, há que distinguir entre o arresto de base (estritamente) germânica e o arresto de base italiana (ou, mais especificamente, lombarda):
(i) o arresto de base germânica tinha uma função essencialmente executiva, quer sobre a pessoa do devedor, quer sobre o seu património, pois que estava fundamentalmente orientado para a satisfação do credor (cf. Kisch, Der deutsche Arrestprozess (1914), 12 ss.; Planitz, Grundlagen des deutschen Arrestprozesses (1922), 69 ss.); é esta a origem do entendimento do arresto como uma "execução antecipada" (cf. Güthe, ZZP 24 (1898), 346 ss. e 365 ss.);
(ii) o arresto de origem italiana orientava-se fundamentalmente para atribuir ao credor uma garantia para o seu crédito através de um processo sumário (cf, Wach, Der Arrestprozess in seiner geschichtlichen Entwicklung I (1868), 72 ss.).
É curioso verificar que ainda foi a ideia de antecipação de execução que levou o legislador da ZPO alemã (de 1877) a incluir o regime do arresto no livro respeitante à execução (onde ainda hoje permanece: § 916 a § 934). Também é interessante constatar que, na versão originária do CPC/1961, ainda se regulava um arresto contra tesoureiros, recebedores ou devedores do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, no qual se permitia que o Ministério Público, além de requerer o arresto, requeresse a prisão do responsável (art. 410.º, n.º 1, CPC/1961).
Em contrapartida, é possível encontrar uma linha de continuidade entre a função de garantia do arresto e a possibilidade da sua conversão em penhora. Já no art. 832.º CPC/1876 se estabelecia o seguinte: "Havendo bens arrestados, o auto de arresto substituirá a penhora para todos os efeitos".
MTS