Processo executivo; legitimidade;
caso julgado; âmbito subjectivo
I. O sumário de RG 28/1/2016 (54/14.2TBPCR-B.G1) é o seguinte:
1) Na ação executiva a questão da legitimidade resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e como devedor.
2) Uma sentença que condene um condomínio a pagar uma determinada quantia a um credor, vale como título executivo contra todos os condóminos.
3) No caso de o título executivo ser um cheque, os executados serão apenas os obrigados cambiários.
II. Tem interesse conhecer esta parte da fundamentação do acórdão:
"O título executivo é um pressuposto da ação executiva na medida em que confere ao direito à prestação invocada um grau de certeza e exigibilidade que a lei reputa de suficientes para a admissibilidade de tal ação.
Na verdade «…a relevância especial dos títulos executivos que resulta da lei deriva da segurança, tida por suficiente, da existência do direito substantivo cuja reparação se pretende efetivar por via da ação executiva.
O fundamento substantivo da ação executiva […] é a própria obrigação exequenda, sendo que o título executivo é o seu instrumento documental legal de demonstração, ou seja, constitui a condição daquela ação e a prova legal da existência do direito de crédito nas suas vertentes fáctico-jurídicas» - Ac. do STJ de 18.10.2007, www.dgsi.pt, p.07B3616.
Sendo certo que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são suportadas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações, salvo disposição em contrário, conforme se estabelece no artigo 1424º nº 1 do Código Civil, para que possa executar-se tal obrigação, torna-se necessário que haja um título de onde resulte tal obrigação.
Refere a apelante que a doutrina e a jurisprudência têm entendido que a sentença proferida contra um condomínio vincula os condóminos podendo ser executada contra estes, entendendo ainda que o mesmo vale para as execuções baseadas em títulos de crédito, nomeadamente cheques, mesmo como meros quirógrafos, como é o caso dos presentes autos.
Sucede, porém, que o título executivo em causa nestes autos não é uma sentença mas, antes, os cheques cujas cópias constam de fls. 26 a 27, e dos mesmos resulta que o sacador e obrigado é, apenas, o Condomínio do Dr. JGM e, como acima se referiu, é o título executivo que determina o fim e os limites da ação executiva.
E, no caso de um cheque (título de crédito), que serve de título executivo, não é a relação subjacente que fundamenta, diretamente, a execução, para efeitos de se determinar a legitimidade das partes, embora, em determinadas circunstâncias se possa discutir a referida relação subjacente.
Como refere o Dr. Lebre de Freitas, ibidem [A Ação Executiva, 2.ª ed,], páginas 103 e seg., “a legitimidade das partes determina-se na ação executiva, com muito maior simplicidade do que na ação declarativa.
Enquanto nesta há que indagar da posição das partes, em face da pretensão, o que implica averiguar a titularidade real, ou meramente afirmada pelo autor, da relação ou outra situação jurídica material em que ela se funda e dá por vezes lugar a dificuldades de distinção perante a questão de mérito, na ação executiva a indagação a fazer resolve-se no confronto entre as partes e o título executivo: têm legitimidade como exequente e executado, respetivamente, quem no título figura como credor e como devedor.”
Não se pode, assim, pretender que uma sentença condenatória que condene um condomínio a pagar uma determinada quantia a um credor, seja equiparável à situação de um cheque cuja sacador e obrigado é um condomínio e que serve de base a uma execução, uma vez que naquela situação, a sentença proferida contra o condomínio vincula os condóminos, podendo ser executada contra estes, isto é, a sentença que condene o condomínio a pagar determinada quantia vale, enquanto título executivo, contra todos os condóminos (cfr., neste mesmo sentido, o Acórdão da Relação de Coimbra de 15/10/2013, relatado pelo Desembargador José Avelino Gonçalves, in www.dgsi.pt), enquanto no caso de o título executivo ser um cheque, os executados serão apenas os obrigados cambiários.
Já no que se refere ao título executivo cheque, o executado tem de ser a pessoa que no título figura como obrigado, isto é, no caso dos autos, o sacador do cheque, independentemente de a obrigação subjacente, poder vincular outrem – sendo certo que podem ainda ser demandados outros obrigados cambiários que, no título estejam juridicamente sujeitos a tal posição, como poderá suceder com os endossantes."
III. O decidido no acórdão não suscita quaisquer dúvidas: se os títulos executivos são cheques, apenas os respectivos devedores cambiários podem ser demandados.
Interessante é a referência de que a sentença condenatória de um condomínio vincula todos os condóminos. Tal como se refere em RC 15/10/2013 (379/03.2TBOFR.C1), "a personalidade judiciária atribuída ao condomínio é meramente formal já que os condóminos é que são “partes” na causa, embora debaixo da “capa” do condomínio representado em juízo pelo administrador.". Efectivamente, o condomínio não é uma entidade dotada de personalidade jurídica, pelo que nada, no plano substantivo, pode vincular o condomínio. Assim, para efeitos substantivos, há que "desconsiderar" a personalidade judiciária do condomínio e "considerar" a personalidade jurídica dos condóminos.
MTS