Decisão interlocutória; recurso;
efeito prejudicial
1. O sumário (elaborado pelo Relator) de RL 10/11/2016 (4444-07.9TBALM-C.L1-6) é o seguinte:
- Interposta apelação autónoma de despacho interlocutório de não admissão de meio de prova, e subindo a mesma em separado ao ad quem, caso venha o recurso a ser julgado procedente, determinando-se a admissão e a produção do meio de prova rejeitado, esta decisão vem a revelar-se prejudicial em relação à apelação que posteriormente foi também interposta pelo mesmo recorrente da sentença final.
- É que, obviamente, o cumprimento do decidido pelo ad quem no âmbito da apreciação da apelação interposta da decisão interlocutória implica forçosamente a invalidação de todo o processado após o requerimento do meio de prova rejeitado, devendo portanto a sentença final apelada considerar-se igualmente como prejudicada.
2. Na fundamentação do acórdão pode ler-se o seguinte:
"[...] o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 684º-B,nº2 e 685º-A, nº 1, ambos do Código de Processo Civil anterior ao aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho , e tendo presente o disposto no artº 6º, nº4, deste último diploma legal ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.
É que, tal como decorre do art. 685º-A nº 1 do Código de Proc.Civil (diploma do qual farão parte as disposição do CPC a referir doravante, na redacção introduzida pelo Dec-Lei nº 303/2007, de 24/8), “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”, ou seja , é inequivocamente nas conclusões recursórias que o recorrente delimita as questões ou os assuntos que pretende que sejam apreciados e decididos pelo tribunal superior.
Indubitavelmente, é pois nas conclusões recursórias que o recorrente fixa objectivamente o recurso, delimitando/balizando com rigor as questões a decidir/solucionar pelo ad quem.
Isto dito, se analisarmos as questões que a apelante dirige a este Tribunal no âmbito das conclusões recursórias que integram a apelação [,,,] interposta da sentença que pôs termo à oposição à execução, e se as compararmos com as conclusões que integram a apelação interposta da decisão interlocutória proferida pelo tribunal a quo em 8/6/2015 [...], inevitável é concluir-mos [sic] que a questão essencial (e praticamente a única) da almejada junção de meios de prova produzidos extraprocessualmente, nos termos do n.°1 do artigo 522.° do Código de Processo Civil, encontra-se inserida no objecto de ambas as apelações.
Ou seja, e em rigor, pretende a recorrente no âmbito da apelação interposta da sentença final, obter uma decisão que, por via indirecta, ponha igualmente em causa uma outra decisão interlocutória proferida pelo tribunal a quo a montante da própria sentença final, sendo que, na sequência de apelação que da mesma também interpôs a exequente, veio já a apelante a obter ganho de causa [...].
Ora bem.
Reza o nº1, do artº 671º, do CPC, sob a epígrafe de “valor da sentença transitada em julgado”, que “ transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 497º e 498º, sem prejuízo do disposto nos artigos 771º a 777º “.
Por sua vez, o dispositivo seguinte do mesmo código, agora sob a epígrafe de “caso julgado formal “, dispõe que “ As sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo”.
Incidem ambos os dispositivos aludidos, como é consabido, ao instituto do caso julgado, o qual no essencial consagra a inadmissibilidade da substituição ou modificação de uma decisão , uma vez transitada em julgado - cfr. artº 677º do Código de Processo Civil - por um qualquer tribunal, inclusive por aquele que a proferiu.
O que distingue porém os dois normativos acima indicados, é que , cabendo no instituto do caso julgado duas formas, pois que, pode o mesmo ser material ou formal, consoante o âmbito da sua eficácia, alude o artº 671º à primeira forma referida e, já o artº 672º, à segunda.
Precisando melhor o que as diferencia - ambas as referidas formas -dir-se-á que o caso julgado formal só tem um valor intraprocessual, ou seja, só é vinculativo no próprio processo em que a decisão foi proferida - cfr. art.º 672º, in fine do CPC - , e, esta última - a decisão, seja sentença ou despacho - incide tão só sobre a relação processual, não apreciando o fundo da acção.
Já o caso julgado material, para além da aludida eficácia intraprocessual , é susceptível de se impor outrossim num processo distinto daquele em que foi proferida a decisão transitada - cfr. art.º 671º, n.º 1, do Código de Processo Civil - e, ademais, o objecto desta última – sentença – é a relação material controvertida, que aprecia e resolve – conhece assim do fundo/mérito da acção.
Em conclusão, estando o caso julgado formal ligado a questões processuais, as quais passam à margem da relação material controvertida, tem ele força obrigatória apenas dentro do processo onde é proferida a decisão, mas, em todo o caso, tal força obrigatória vincula/obriga não apenas os destinatários (as partes), mas também o próprio tribunal. [...]
Postas estas breves considerações, e incidindo agora sobre a concreta tramitação dos presentes autos, e como vimos supra, é inequívoco que a questão que integra o objecto da apelação que a recorrente interpôs da sentença de 25/1/2016 , foi já objecto de julgamento por este mesmo Tribunal da Relação, o que sucedeu por Ac. de 12/5/2016 [...].
E tendo-o sido, por força do disposto no artº 672º, nº1, do CPC, é inevitável que sobre a referida questão não possa novamente este tribunal emitir qualquer pronúncia /julgamento, porque já resolvida, restando ao tribunal a quo cumpri-la.
Por fim resta acrescentar que, tendo a apelação decidida por este tribunal da Relação - no douto Ac. 12/5/2016 – incidido sobre meio de prova que foi rejeitado, determinando a sua admissão, é evidente que o cumprimento do decidido implica forçosamente a invalidação de todo o processado após o requerimento da Exequente na sessão de julgamento de 25/5/2015, devendo portanto a sentença apelada considerar-se igualmente como prejudicada, pois que, após o reinício e conclusão da audiência, outra terá que ser proferida.
Em rigor, e tal como bem nota António Santos Abrantes Geraldes [In Recursos em Processo Civil, Almedina, Novo Regime, 2010, Pág. 206, nota 324], como que a apelação interposta do despacho interlocutório de não admissão de meio de prova, ao seu julgada procedente, veio a revelar-se prejudicial em relação à apelação interposta da sentença final, inutilizando-a.
Em suma, a questão prévia conhecida é atendida, não se nos impondo conhecer do objecto da apelação."
[MTS]