Execução; extinção;
pagamento voluntário
I. O sumário de RL 8/2/2018 (2495/14.6.T8OER.L1-6) é o seguinte:
1.– Tendo exequente e executada atravessado em acção coerciva instrumento por ambas subscrito no qual declaram por termo à execução, por acordo e em face do pagamento pela segunda da quantia de 58.000,00€, requerendo que em razão do referido pagamento se considere extinta a instância executiva, nada mais havendo a exigir ou a receber pelas partes, consubstancia ele documento idóneo conducente à extinção da execução, nos termos do nº 5 do artº 846º, do CPC.
2.– O instrumento referido [...], para poder desencadear a extinção da instância executiva, não carece de ser objecto de uma qualquer decisão/sentença judicial de homologação e consequente declaração de extinção da execução, produzindo de imediato e automaticamente, uma vez pagas as custas a liquidar, o efeito extintivo da instância coerciva.
3.– Invocando o exequente, em momento posterior, padecer o instrumento referido [...] de vício substantivo susceptível de permitir a respectiva anulação, para tanto carece a referida parte de intentar a competente acção, não podendo a referida questão ser dirimida no âmbito da própria acção executiva.
II. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
1. [...] em face do disposto nos artºs 846º, nº 5 [“Quando o requerente junte documento comprovativo de quitação, perdão ou renúncia por parte do exequente ou qualquer outro título extintivo, suspende-se logo a execução e liquida-se a responsabilidade do executado”], e 848º, nº1, ambos do CPC [A desistência do exequente extingue a execução; mas, se já tiverem sido vendidos ou adjudicados bens sobre cujo produto hajam sido graduados outros credores, a estes é paga a parte que lhes couber nesse produto], e não obstante a causa normal de extinção de uma execução ser o pagamento coercivo, nada obsta a que uma execução se extinga com fundamento em outras formas admitidas na lei civil [ cfr. v. g. nos artºs 837º a 873º, do C.Civil], podendo inclusive ocorrer a extinção da instância executiva por transacção, nos termos do artº 277º, alínea d), do CPC (Cfr. José Lebre de Freitas, in Direito Processual Civil, II, 3ª edição, pág. 224., e em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 355/356).
Atravessado nos autos um qualquer instrumento apto a operar/desencadear a extinção da instância executiva, e ao invés do que sucedia no âmbito do regime anterior à reforma da acção executiva [caso em que a extinção resultava necessariamente de uma decisão judicial proferida - cfr. artº 919º , nºs 1 e 2, do CPC, com a redacção anterior às alterações introduzidas pelo DL n.º 38/2003, de 08 de Março], pacifico é hoje que nada obriga à prolação de decisão/sentença judicial de extinção da execução, produzindo-se automaticamente - com a mera junção aos autos de pertinente instrumento - o efeito extintivo da instância (Cfr. José Lebre de Freitas, em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 356),
Assim, e v. g. sendo atravessado nos autos de execução um instrumento alusivo a uma desistência do pedido, ou até a uma transacção, e dispondo ambos na acção executiva da mesma natureza de negócio de direito privado que têm na acção declarativa, produzem eles de imediato os respectivos efeitos de direito civil (como sucede na acção declarativa) e também o efeito processual de extinção da instância executiva, não carecendo de homologação por sentença judicial (Cfr. José Lebre de Freitas, em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 355).
Quando muito, e para o referido efeito, exigir-se-á tão só que, com base em mera análise perfunctória, se tenham como cumpridas as formalidades “formais” para a prática - pelas partes - de actos processais [cfr. artºs 144º e segs. do CPC], e, ademais, ainda quando necessariamente sujeitos os referidos actos a uma sentença judicial homologatória [o que não é o caso, como vimos já], certo é que também esta última em caso algum tem por objecto decidir a controvérsia substancial, mas apenas fiscalizar a regularidade e a validade da desistência /acordo.
Ou seja, como com clareza se decidiu em Ac. do STJ de 30/10/2001 (...), e v. g. no tocante a concreta transacção, esta última (como negócio das partes) vale por si, sendo a intervenção do juiz - em sede de homologação - de mera fiscalização sobre a legalidade do objecto desse contrato (cfr. 1248º, n.º 1, do Cód. Civil) e da qualidade das pessoas que o celebram, não conhecendo do mérito, antes sancionando a solução que as partes encontraram para a demanda, como que absorvendo o acertamento que esses sujeitos processuais deram ao litígio, no âmbito da autonomia privada e dentro dos limites da lei, convencionando o que bem entenderam quanto ao objecto da causa.
É certo que, o acto (a se) das partes de desistência e/ou transacção, pode também estar afectado de vícios próprios e específicos susceptíveis de conduzir à declaração da sua nulidade ou anulação [porque sujeitos, enquanto declarações negociais, ao regime geral dos negócios jurídicos dos arts. 217º e segs. do CC], mas, como decorre dos nºs 1 e 2 do artº 291º, do CPCivil [reza o nº2, que “O trânsito em julgado da sentença proferida sobre a confissão, a desistência ou a transacção não obsta a que se intente a acção destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação“], para tanto carece a parte interessada/prejudicada de intentar a competente acção destinada à declaração da sua nulidade ou à sua anulação, sem prejuízo da caducidade do direito a esta última.
Em suma, não é de todo na própria acção em que tais actos são praticados que tem lugar a averiguação da pertinente e subjacente factualidade relacionada com a validade substantiva da desistência e/ou transacção, através de produção de prova, maxime da aferição se não enfermam eles de um qualquer vicio da vontade do declarante.
Mas, se dúvidas existissem no tocante ao acerto do acabado de aduzir, certo é que , em face do disposto no artº 146º do actual CPC [1 - É admissível a rectificação de erros de cálculo ou de escrita, revelados no contexto da peça processual apresentada. 2 - Deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte, o suprimento ou a correcção de vícios ou omissões puramente formais de actos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correcção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa“], dúvidas não se justificam no tocante à total impertinência de , na própria acção em que tenham sido produzidos/gerados, se aceitar a apreciação e discussão sobre a eventualidade de as subjacentes declarações de vontade estarem afectadas de um qualquer vício da vontade.
É que, além de a possibilidade de suprimento ou correcção de vícios apenas ser possível em relação a vícios puramente formais, exigível é ainda que a referida correcção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa [o que manifestamente não ocorrerá relativamente a incidente despoletado em sede de acção executiva , a qual, ao invés da acção declarativa - destinada a reconhecer ou a constituir um direito subjectivo do autor - tem por desiderato a realização coerciva de um direito já pré-reconhecido], o que não é o caso, porque obrigando necessariamente a respectiva resolução a produção de prova.
Em conclusão, não se justificando a rectificação do acto atravessado nos autos pelo exequente e executada em 13/7/2017 e ao abrigo do disposto no artº 146º do CPC [porque longe de evidenciar ele um qualquer erro de escrita e/ou um vício puramente formal] e, porque a respectiva anulação demanda a propositura da competente acção, não sendo a mesma susceptível de ser processada no âmbito da própria acção na qual foi ele praticado - cfr. artº 291º, nºs 1 e 2, do CPC -, nenhum reparo merece a decisão recorrida."
[MTS]
1.– Tendo exequente e executada atravessado em acção coerciva instrumento por ambas subscrito no qual declaram por termo à execução, por acordo e em face do pagamento pela segunda da quantia de 58.000,00€, requerendo que em razão do referido pagamento se considere extinta a instância executiva, nada mais havendo a exigir ou a receber pelas partes, consubstancia ele documento idóneo conducente à extinção da execução, nos termos do nº 5 do artº 846º, do CPC.
2.– O instrumento referido [...], para poder desencadear a extinção da instância executiva, não carece de ser objecto de uma qualquer decisão/sentença judicial de homologação e consequente declaração de extinção da execução, produzindo de imediato e automaticamente, uma vez pagas as custas a liquidar, o efeito extintivo da instância coerciva.
3.– Invocando o exequente, em momento posterior, padecer o instrumento referido [...] de vício substantivo susceptível de permitir a respectiva anulação, para tanto carece a referida parte de intentar a competente acção, não podendo a referida questão ser dirimida no âmbito da própria acção executiva.
II. Na fundamentação do acórdão afirma-se o seguinte:
1. [...] em face do disposto nos artºs 846º, nº 5 [“Quando o requerente junte documento comprovativo de quitação, perdão ou renúncia por parte do exequente ou qualquer outro título extintivo, suspende-se logo a execução e liquida-se a responsabilidade do executado”], e 848º, nº1, ambos do CPC [A desistência do exequente extingue a execução; mas, se já tiverem sido vendidos ou adjudicados bens sobre cujo produto hajam sido graduados outros credores, a estes é paga a parte que lhes couber nesse produto], e não obstante a causa normal de extinção de uma execução ser o pagamento coercivo, nada obsta a que uma execução se extinga com fundamento em outras formas admitidas na lei civil [ cfr. v. g. nos artºs 837º a 873º, do C.Civil], podendo inclusive ocorrer a extinção da instância executiva por transacção, nos termos do artº 277º, alínea d), do CPC (Cfr. José Lebre de Freitas, in Direito Processual Civil, II, 3ª edição, pág. 224., e em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 355/356).
Atravessado nos autos um qualquer instrumento apto a operar/desencadear a extinção da instância executiva, e ao invés do que sucedia no âmbito do regime anterior à reforma da acção executiva [caso em que a extinção resultava necessariamente de uma decisão judicial proferida - cfr. artº 919º , nºs 1 e 2, do CPC, com a redacção anterior às alterações introduzidas pelo DL n.º 38/2003, de 08 de Março], pacifico é hoje que nada obriga à prolação de decisão/sentença judicial de extinção da execução, produzindo-se automaticamente - com a mera junção aos autos de pertinente instrumento - o efeito extintivo da instância (Cfr. José Lebre de Freitas, em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 356),
Assim, e v. g. sendo atravessado nos autos de execução um instrumento alusivo a uma desistência do pedido, ou até a uma transacção, e dispondo ambos na acção executiva da mesma natureza de negócio de direito privado que têm na acção declarativa, produzem eles de imediato os respectivos efeitos de direito civil (como sucede na acção declarativa) e também o efeito processual de extinção da instância executiva, não carecendo de homologação por sentença judicial (Cfr. José Lebre de Freitas, em A Acção Executiva -Depois da reforma da reforma, 5ª edição, pág. 355).
Quando muito, e para o referido efeito, exigir-se-á tão só que, com base em mera análise perfunctória, se tenham como cumpridas as formalidades “formais” para a prática - pelas partes - de actos processais [cfr. artºs 144º e segs. do CPC], e, ademais, ainda quando necessariamente sujeitos os referidos actos a uma sentença judicial homologatória [o que não é o caso, como vimos já], certo é que também esta última em caso algum tem por objecto decidir a controvérsia substancial, mas apenas fiscalizar a regularidade e a validade da desistência /acordo.
Ou seja, como com clareza se decidiu em Ac. do STJ de 30/10/2001 (...), e v. g. no tocante a concreta transacção, esta última (como negócio das partes) vale por si, sendo a intervenção do juiz - em sede de homologação - de mera fiscalização sobre a legalidade do objecto desse contrato (cfr. 1248º, n.º 1, do Cód. Civil) e da qualidade das pessoas que o celebram, não conhecendo do mérito, antes sancionando a solução que as partes encontraram para a demanda, como que absorvendo o acertamento que esses sujeitos processuais deram ao litígio, no âmbito da autonomia privada e dentro dos limites da lei, convencionando o que bem entenderam quanto ao objecto da causa.
É certo que, o acto (a se) das partes de desistência e/ou transacção, pode também estar afectado de vícios próprios e específicos susceptíveis de conduzir à declaração da sua nulidade ou anulação [porque sujeitos, enquanto declarações negociais, ao regime geral dos negócios jurídicos dos arts. 217º e segs. do CC], mas, como decorre dos nºs 1 e 2 do artº 291º, do CPCivil [reza o nº2, que “O trânsito em julgado da sentença proferida sobre a confissão, a desistência ou a transacção não obsta a que se intente a acção destinada à declaração de nulidade ou à anulação de qualquer delas, ou se peça a revisão da sentença com esse fundamento, sem prejuízo da caducidade do direito à anulação“], para tanto carece a parte interessada/prejudicada de intentar a competente acção destinada à declaração da sua nulidade ou à sua anulação, sem prejuízo da caducidade do direito a esta última.
Em suma, não é de todo na própria acção em que tais actos são praticados que tem lugar a averiguação da pertinente e subjacente factualidade relacionada com a validade substantiva da desistência e/ou transacção, através de produção de prova, maxime da aferição se não enfermam eles de um qualquer vicio da vontade do declarante.
Mas, se dúvidas existissem no tocante ao acerto do acabado de aduzir, certo é que , em face do disposto no artº 146º do actual CPC [1 - É admissível a rectificação de erros de cálculo ou de escrita, revelados no contexto da peça processual apresentada. 2 - Deve ainda o juiz admitir, a requerimento da parte, o suprimento ou a correcção de vícios ou omissões puramente formais de actos praticados, desde que a falta não deva imputar-se a dolo ou culpa grave e o suprimento ou a correcção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa“], dúvidas não se justificam no tocante à total impertinência de , na própria acção em que tenham sido produzidos/gerados, se aceitar a apreciação e discussão sobre a eventualidade de as subjacentes declarações de vontade estarem afectadas de um qualquer vício da vontade.
É que, além de a possibilidade de suprimento ou correcção de vícios apenas ser possível em relação a vícios puramente formais, exigível é ainda que a referida correcção não implique prejuízo relevante para o regular andamento da causa [o que manifestamente não ocorrerá relativamente a incidente despoletado em sede de acção executiva , a qual, ao invés da acção declarativa - destinada a reconhecer ou a constituir um direito subjectivo do autor - tem por desiderato a realização coerciva de um direito já pré-reconhecido], o que não é o caso, porque obrigando necessariamente a respectiva resolução a produção de prova.
Em conclusão, não se justificando a rectificação do acto atravessado nos autos pelo exequente e executada em 13/7/2017 e ao abrigo do disposto no artº 146º do CPC [porque longe de evidenciar ele um qualquer erro de escrita e/ou um vício puramente formal] e, porque a respectiva anulação demanda a propositura da competente acção, não sendo a mesma susceptível de ser processada no âmbito da própria acção na qual foi ele praticado - cfr. artº 291º, nºs 1 e 2, do CPC -, nenhum reparo merece a decisão recorrida."
[MTS]