"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



22/10/2018

Jurisprudência 2018 (97)


Recurso de revisão;
documento superveniente


I. O sumário de RL 10/4/2018 (2020/12.3TVLSB-A.L1-1) é o seguinte:

1– O recurso extraordinário de revisão, apenas poderá ter por objecto, os taxativos fundamentos plasmadas no art. 696º do CPC.

2– Uma sentença judicial não pode servir de fundamento a recurso extraordinário de revisão, por não poder ser qualificada como um documento.

II. Na fundamentação do acórdão escreveu-se o seguinte:

"Veio o recorrente interpor o presente recurso de revisão, invocando para o efeito, que em Outubro de 2017 veio a tomar conhecimento do teor do despacho saneador proferido no Processo Judicial nº. 1694/11.7T2SNT, que correu termos pelo Tribunal da Comarca da Grande Lisboa, Sintra, onde se conclui que a Universidade Sénior de Queluz, não possui personalidade jurídica, nem capacidade judiciária.

Ora, como alude Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8ª ed., Almedina, pág. 305 «O recurso extraordinário de revisão é um expediente processual que permite a quem tenha ficado vencido ou prejudicado num processo anteriormente terminado, a sua reabertura, mediante a invocação de certas causas taxativamente indicadas na lei».

Os fundamentos do recurso de revisão são os taxativamente previstos no art. 696º do CPC., ou seja, a decisão transitada em julgado só pode ser objecto de revisão quando: (…)


c) - Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.

Com efeito, o fundamento do recorrente reporta-se à existência e do seu conhecimento, de um documento superveniente ao trânsito da decisão proferida nos autos.

Ora, como se alude no Ac. do STJ. de 11-9-2007, in http://www.dgsi.pt «O documento superveniente apenas fundamentará a revisão quando, por si só, seja capaz de modificar a decisão em sentido mais favorável ao recorrente.

Para servir de fundamento à revisão é necessário que o documento, além do carácter da superveniência, faça prova de um facto inconciliável com a decisão a rever, isto é, que só por ele se verifique ter esta assentado numa errada averiguação de facto relevante para o julgamento de direito».

E para que o documento possa fundamentar a revisão, como se esclarece no Ac. do STJ. de 19-10-2017, in http://www.dgsi.pt «Tem que revestir dois requisitos cumulativos: a novidade (que significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão em causa, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pôde dele socorrer-se) e a suficiência (que implica que o documento constitua um meio de prova susceptível de, por si só, demonstrar ou infirmar facto ou factos relevantes por forma a conduzir a decisão mais favorável ao recorrente)».

No caso vertente, o recorrente baseia-se no que apelida de documento, o qual consiste numa decisão judicial.

Ora, uma sentença judicial não pode servir de fundamento a recurso extraordinário de revisão, por não poder ser qualificada como um documento, dado não se enquadrar na noção técnica vertida no art. 362º do Código Civil (cfr. Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, vol. II, Almedina, pág. 573).

Nos termos plasmados no art. 362º do C. Civil, prova documental é a que resulta de documento; diz-se documento qualquer objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa ou facto.

O documento em que o recorrente se estriba, não possui as virtualidades desencadeadoras do mecanismo da revisão.

O despacho saneador em causa, em nada colide e em nada afecta a questão da legitimidade das partes decidida no âmbito dos presentes autos.

Efectivamente, os réus nos presentes autos são Carlos…, Ilídio... e Manuela ...

O conhecimento aqui da sua ilegitimidade, não carecia de qualquer prova, ou documento, uma vez que apenas se tratava de uma questão meramente processual.

Tal como o autor configurou a acção, os réus demandados não figuravam na lide como verdadeiros sujeitos passivos.

Por seu turno, o saneador sentença ora apresentado, como documento com virtualidades de modificação daquela decisão, é completamente inócuo.

Com efeito, não só o mesmo, tratando-se de uma sentença, não funciona como documento, no sentido conferido na al. c) do art. 696º do CPC., como, ainda que assim sucedesse, de igual modo, não seria de lhe conferir qualquer virtualidade.

Compulsado o saneador sentença agora invocado, constatamos que os réus daquela acção são diferentes dos réus da presente, bem como, ali se decidiu que a Universidade Sénior de Queluz, não tem personalidade judiciária.

Ora, não existe qualquer correlação entre ambas as decisões, quer a nível dos sujeitos processuais passivos, quer a nível das decisões tomadas, pois, ilegitimidade e personalidade judiciárias são realidades completamente diferentes.

Destarte, o despacho saneador cujo conhecimento foi agora suscitado pelo recorrente, não possui quaisquer virtualidades, ou seja, não é suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida, decaindo a pretendida revisão.

Em síntese:

- O recurso extraordinário de revisão, apenas poderá ter por objecto, os taxativos fundamentos plasmadas no art. 696º do CPC.

- Uma sentença judicial não pode servir de fundamento a recurso extraordinário de revisão, por não poder ser qualificada como um documento."

[MTS]