I - Só pode considerar-se existente – no âmbito da apreciação da figura da dupla conforme no NCPC (2013) – uma fundamentação essencialmente diferente quando a solução jurídica do pleito prevalecente na Relação tenha assentado, de modo radicalmente ou profundamente inovatório, em normas, interpretações normativas ou institutos jurídicos perfeitamente diversos e autónomos dos que haviam justificado e fundamentado a decisão proferida na sentença apelada – ou seja, quando tal acórdão se estribe decisivamente no inovatório apelo a um enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado daquele em que assentara a sentença proferida em 1.ª instância.
II -Tal situação tem-se por verificada quando a condenação da ré na sentença apelada radicou na invocação de uma violação culposa do princípio da boa fé contratual, quer na fase pré-contratual, quer na fase pós contratual, ulterior à consumação da compra e venda do imóvel, apelando a Relação, não ao plano de qualquer responsabilidade situada no perímetro dos contratos celebrados, mas antes à violação culposa pela ré de um dever de conservação das partes comuns do imóvel, decorrente da sua qualidade, legalmente imposta, de administrador provisório do edifício em regime de propriedade horizontal – deslocando, assim, a base normativa da condenação do âmbito da violação do princípio da boa fé contratual para o plano das consequências do incumprimento culposo dos deveres que recaem sobre o administrador, como órgão da propriedade horizontal.
III - A parte interessada na relevância de algum facto superveniente, ocorrido ulteriormente à fase dos articulados, mas anteriormente ao encerramento da audiência final em 1.ª instância, e que se mostre substantivamente relevante, pode introduzi-lo no processo através da apresentação tempestiva de articulado superveniente, nos termos previstos nos arts. 588.º e 589.º do NCPC – não podendo tal omissão ser oficiosamente suprida pelo tribunal, incluindo nas respostas aos pontos da base instrutória, reportados à situação vigente na data em que a acção foi instaurada, a situação factual superveniente, não oportunamente alegada pelo interessado.
IV - Estando em causa uma pretensão indemnizatória fundada no art. 227.º do CC, é indispensável que o lesado demonstre que a ré/vendedora de determinadas fracções em edifício em propriedade horizontal actuou culposamente na fase das negociações preliminares – criando, nomeadamente, uma falsa aparência quanto às qualidades futuras do empreendimento, levando os compradores a contratar nas precisas condições acordadas em prejuízo manifesto do seu interesse – não se verificando tais pressupostos da responsabilidade civil pré-contratual se apenas tiver ficado provado que as previsões então realizadas se não concretizaram ulteriormente.
V - Não pode criar-se para a entidade vendedora de determinadas fracções de edifício sujeito ao regime da propriedade horizontal, no plano estritamente contratual e por via do princípio da boa fé, um dever lateral de, ao longo dos anos, providenciar (nessa veste de vendedora) pela adequada conservação do prédio, respondendo perante os condóminos/compradores pelos danos decorrentes de deficiências do imóvel, causadas pela negligente omissão de actos conservatórios: na verdade, consumada ou exaurida a venda, o tema da conservação futura do imóvel e das omissões culposas que nesta sede possam ocorrer já não se situa no perímetro contratual (ainda que no plano da pós eficácia das obrigações emergentes de contrato de compra e venda, há muito exaurido e findo), mas antes no âmbito institucional da propriedade horizontal e das competências e actuações dos órgãos que juridicamente a integram.
VI - Não tendo o autor invocado, como base da pretensão indemnizatória que deduziu, a qualidade que assistiria, porventura, à ré, de administradora provisória do condomínio, nos termos do art. 1435.º-A do CC, fundando antes o dever de conservação do imóvel vendido exclusivamente no perímetro contratual e no âmbito de alegada violação do princípio da boa fé, não pode ser tal facto introduzido no processo na fase de recurso por implicar apelo a um facto essencial não alegado, estruturante de uma outra causa de pedir.