"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



30/09/2015

Jurisprudência estrangeira (3)


Responsabilidade civil; "carrinhos de compras"; colisão com automóvel


OLG Hamm 18/8/2015 (9 U 169/14) decidiu o seguinte:

O proprietário de uma loja deve cuidar que, depois do fecho diário da loja, os seus "carrinhos de compras" ficam arrumados de forma segura; os "carrinhos de compras" devem estar arrumados de maneira a assegurar que não possam ser utilizados por estranhos e que não possam deslocar-se por eles próprios.


Jurisprudência (199)



Processo executivo; deserção da instância; competência


O sumário de RE 10/9/2015 (1169/05.3TBBJA.E1) é o seguinte:


Não havendo atribuição da competência para o efeito, quer ao juiz do processo, quer à secretaria, cabe ao agente de execução, nos termos do art.º 719º, n.º 1, do NCPC, decidir em primeira linha da deserção da instância do processo executivo.

29/09/2015

Jurisprudência (198)



Meios de prova; inspecção judicial; verificação não judicial qualificada


O sumário de RL 8/9/2015 (4474/12.9TBVFX.L1-1) é o seguinte: 

1. O despacho que não admitiu a realização de inspeção ao local é autonomamente impugnável no prazo de 15 dias após ter sido proferido, sob pena de transitar em julgado, não podendo ser impugnável com o recurso interposto da decisão final.

2. A diligência prevista no artigo 494.º do CPC – verificação [não] judicial qualificada – só é admissível quando o for a inspeção ao local. Pode ser realizada oficiosamente ou a requerimento da parte na fase de apresentação dos articulados. Nada tendo sido requerido pela parte, a não realização oficiosa de tal diligência insere-se no âmbito do poder discricionário do julgador, consequentemente irrecorrível.

3. A constatação do facto em si – taxa de alcoolemia – pode funcionar como uma base de presunção (facto conhecido), da qual se pode inferir o facto desconhecido (nexo de causalidade entre a alcoolemia e o acidente), por aplicação dos artigos 349.º e 351.º do Código Civil, desde que conexionado com a apreciação crítica dos demais factos relevantes sobre a dinâmica do acidente e circunstâncias envolventes das quais resulte, de forma plausível e razoável, a existência do referido nexo de causalidade.

4. Infere-se, nesses termos, a existência de nexo de causalidade adequada entre o estado etílico do condutor e o acidente quando aquele conduzia com uma TAS de 1,36g/l e embateu na traseira veículo que se encontrava parado, à sua frente, por não se ter apercebido que o trânsito se encontrava parado.


28/09/2015

Bibliografia (201)


-- Schlosser / Hess, EuZPR / EU-Zivilprozessrecht / EuGVVO, EuVTVO, EuMahnVO, EuBagVO, HZÜ, EuZVO, HBÜ, EuBVO, EuKtPVO / Kommentar, 4.ª ed. (Beck: München 2015)


Bibliografia (200)


-- Hay, P., Notes on the European Union’s Brussels-I “Recast” Regulation / An American Perspective, ELF 2013, 1


Paper (122)


-- Krommendijk, J., The Use of ECTHR Case Law by the CJEU after Lisbon: The View of the Luxembourg Insiders (09.2015)

O novo regime de alimentos devidos a filho maior ou emancipado; contributo para a interpretação da Lei n.º 122/2015, de 1/9 (2)



[Para aceder ao texto completo clicar em J. H. Delgado de Carvalho]

 

27/09/2015

Jurisprudência constitucional (51)


Títulos executivos perpétuos

1. TC 23/9/2015 (408/2015) decidiu: 

[...] declara[r], com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma que aplica o artigo 703.º do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, a documentos particulares emitidos em data anterior à sua entrada em vigor, então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil de 1961, constante dos artigos 703.º do Código de Processo Civil, e 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, por violação do princípio da proteção da confiança (artigo 2.º da Constituição). 

2. O acórdão -- tirado com oito votos a favor e quatro contra -- consagra a orientação segundo a qual os interesses do credor (possível exequente) se sobrepõem aos interesses do devedor (possível executado). Já houve a oportunidade de referir, em diferentes contextos, que a solução é muito discutível.

3. Sobre a problemática, cf. Jurisprudência constitucional (48) e respectivas remissões. Também tem interesse, em sentido contrário ao do acórdão, RP 15/9/2015 (335/14.5T8OVR-C.P1).

MTS


25/09/2015

Jurisprudência (197)



Plano de recuperação; contratos bilaterais


1. O sumário de RL 10/9/2015 (442/14.4T8VFX-A.L1-6) é o seguinte: 

Os créditos por obrigações de contratos bilaterais em que as contraprestações, recíprocas e sinalagmáticas, ainda não foram cumpridas, não podem ser afectados pelo plano de recuperação, no âmbito do processo especial de revitalização (PER), sem o acordo da contraparte.

2. Da fundamentação do acórdão consta o seguinte trecho:

«No caso de insolvência o art.º 102.º do CIRE [...] prevê que, no caso de “qualquer contrato bilateral em que, à data da insolvência, não haja ainda total cumprimento nem pelo insolvente nem pela outra parte, o cumprimento fica suspenso até que o administrador da insolvência declare optar pela execução ou recusar o cumprimento.” A opção pelo cumprimento pressupõe a susceptibilidade do cumprimento pontual das obrigações contratuais, por parte da massa insolvente (vide art.º 102.º n.º 4). Em caso de recusa de cumprimento, deixam de existir prestações recíprocas, podendo constituir-se a favor de um das partes um crédito pecuniário sobre a outra, de acordo com as regras previstas no n.º3 do art.º 102.º.

Sucede, porém, que no PER, os contratos bilaterais não se suspendem no seu decurso, nem o administrador judicial provisório ou o devedor podem optar pela sua recusa ou cumprimento. Isto é, o devedor pode como é evidente deixar de cumprir o contrato, voluntariamente, mas as suas obrigações não se extinguem e o seu cumprimento pode ser imposto por via da acção de cumprimento e da execução ( art.º 817.º do Código Civil) e da execução específica.

Assim, no PER, mantém-se as obrigações recíprocas e sinalagmáticas. Se, como vimos a modificação unilateral do contrato não é permitida num processo de insolvência, muito menos seria admissível num processo especial de revitalização, em que nem o administrador judicial provisório, nem o devedor podem optar por recusar o cumprimento do contrato e o devedor não se encontra sequer numa situação de insolvência actual [Salazar Casanova/Sequeira Dinis, PER / O Processo Especial de Revitalização (Coimbra Editora 2014), p. 67-70]. Portanto, “os créditos por obrigações de contratos bilaterais em que as contraprestações, recíprocas e sinalagmáticas, ainda não foram cumpridas, não podem ser afectados pelo plano de recuperação, sem o acordo da contraparte. Com efeito, alterar unilateralmente as obrigações de uma parte, mantendo inalteradas as da contraparte, afectaria o sinalagma contratual e redundaria numa verdadeira modificação do contrato.

A modificação dos contratos apenas é possível nos termos do art.º 437.º do Código Civil (…). Um plano não pode introduzir modificações contratuais contra a vontade das contrapartes. Também no processo de insolvência isso não pode suceder. (…) A modificação unilateral do contrato consubstanciaria a imposição ao credor, contra a sua vontade, de uma diferente relação jurídica e posição contratual, o que seria uma afronta grave e injustificável aos seus direitos" [Idem, p. 69].»
 
MTS
 

24/09/2015

Jurisprudência (196)



Excepções peremptórias; caducidade; condições do conhecimento


I. O sumário de RP 14/9/2015 (388/11.8TJPRT-A.P1) é o seguinte:

1. O excecionante tem o ónus de alegar os factos integradores da exceção perentória que deduz.

2. As prestações periódicas são uma das modalidades das prestações duradouras, sendo que estas últimas, por sua vez, se distinguem das prestações fracionadas ou repartidas. 

3. Nas prestações duradouras, o tempo influi decisivamente na determinação do seu objeto, especialmente do seu montante, enquanto nas prestações fracionadas o decurso do tempo contende apenas com o modo de execução da prestação, servindo o tempo apenas para permitir a liquidação de uma certa prestação, de modo repartido, dividindo-a em duas ou mais prestações que se sucedem separadas por um maior ou menor lapso temporal.

4. Dentro das prestações duradouras distinguem-se as prestações de execução continuada, ou seja, aquelas em que o seu cumprimento é ininterrupto, das prestações reiteradas ou com trato sucessivo, que se renovam em prestações singulares sucessivas, podendo estas, por sua vez, ser periódicas ou não periódicas, consoante se renovem num dado período temporal certo ou não.

5. As despesas de conservação, ainda que impostas legalmente com uma periodicidade mínima, não são necessariamente periódicas pois que, se podem ser fixadas a forfait, para serem cobradas anualmente, na veste das denominadas quotizações do condomínio, podem ter caráter pontual, determinado em função do concreto custo das obras em causa e do momento em que se decide efetuar certa obra.

6. Omitindo os excecionantes a alegação de factos que permitam concluir que os montantes exigidos nestes autos constituem prestações periódicas, o tribunal
a quo estava em condições de julgar improcedente a exceção de prescrição fundada na previsão da alínea g), do artigo 310º do Código Civil. 

II. Da fundamentação do acórdão consta a seguinte afirmação:
 
"[...] se, como justamente salienta o Sr. Professor Teixeira de Sousa no seu blog do IPPC[...], a procedência de uma exceção perentória não pode ser decidida sem que antes se provem os factos constitutivos do direito relativamente à qual opera essa exceção[...], já o mesmo não sucede quando se trate de julgar improcedente uma exceção, como é o caso dos autos". 


Como se refere em nota de rodapé, o tema do conhecimento das excepções peremptórias foi tratado no post Conhecimento de excepções peremptórias no despacho saneador? Depende!... . Neste momento, só há que agradecer a simpática citação e remeter para o referido post.

III. a) Na nota de rodapé 13 que acompanha a afirmação acima transcrita é realizada a seguinte observação:

"Pela nossa parte, temos fortes reservas em seguir o entendimento do Sr. Professor Teixeira de Sousa quando esteja em causa o conhecimento da caducidade do exercício de um direito potestativo, como seja, por exemplo, o de investigação de paternidade, não se nos afigurando existir qualquer entrave, antes pelo contrário, a que seja conhecida e julgada procedente antes da determinação dos factos constitutivos do direito intempestivamente exercido".

Os direitos potestativos são uma realidade bastante mais complexa do que pode parecer e tornam-se ainda mais complexos quando têm de ser exercidos através dos tribunais (como é o caso do direito à investigação da paternidade -- ou, talvez melhor, do direito ao estabelecimento da paternidade). A doutrina alemã costuma distinguir entre os direitos potestativos -- designados habitualmente como Gestaltungsrechte depois da sua "descoberta" por Seckel, FG Richard Koch (1903), 205 ss. -- e os "direitos de acção potestativos" -- os chamados Gestaltungsklagerechte (cf., v. g., Bötticher, FS Hans Dölle I (1963), 54 ss.). Uma boa exposição sobre a dogmática dos direitos potestativos encontra-se em Hattenhauer, Einseitige private Rechtsgestaltung / Geschichte und Dogmatik (2011), 188 ss., 197 ss. e 229 ss.

A este propósito tem interesse um rápido apontamento de história dogmática. Durante o século XIX, alguns processualistas descobriram que havia um grupo de acções e de sentenças que não se encaixavam nas tradicionais acções e sentenças condenatórias; foi com base nestas reflexões que E. Seckel (1864-1924) veio esclarecer que a essas acções e sentenças correspondia um novo tipo de direito subjectivo -- precisamente, o direito potestativo (cf. FG Richard Koch (1903), 205 ss). Portanto, não foi o direito potestativo que originou a acção constitutiva como o correspondente meio de tutela, mas o contrário: primeiro foi individualizado o meio de tutela e depois a respectiva categoria substantiva.  

Os direitos potestativos de exercício necessariamente jurisdicional são direitos à constituição de uma determinada situação jurídica por um tribunal. Depois de a situação jurídica se encontrar constituída pelo tribunal, não mais se pode falar de um direito à constituição dessa situação. Pode assim afirmar-se que, quando a paternidade é estabelecida pelo tribunal, o direito ao seu estabelecimento deixa de existir, pois que não pode subsistir um direito ao estabelecimento da paternidade depois de o tribunal ter estabelecido essa mesma paternidade. Todos os direitos potestativos se extinguem quando se constitui a situação que decorre do seu exercício.

Quando se fala de direitos potestativos, há que perspectivar o processo civil, não como um meio de tutela, mas antes como um meio de exercício desses direitos. O que o autor pretende obter não é a tutela do seu direito ao estabelecimento da paternidade (aquela parte não pretende o reconhecimento daquele direito), mas antes o estabelecimento da paternidade (ou seja, a situação que decorre do exercício daquele direito). É aliás por isso que os direitos potestativos são exercidos numa acção constitutiva (art. 10.º, n.º 2 e 3, al. c), CPC) e originam uma sentença constitutiva (como é o caso, por exemplo, da sentença que estabelece a paternidade).

É esta circunstância que justifica que a caducidade de um direito potestativo possa ser conhecida durante o seu exercício em juízo, necessariamente antes da constituição da situação jurídica decorrente desse exercício. A excepção peremptória é sempre relativa, porque se opõe sempre a uma pretensão; a excepção de caducidade é oponível ao direito ao estabelecimento da paternidade, não a este estabelecimento. O que pode caducar é o direito ao estabelecimento da paternidade, não este estabelecimento. Aliás, se a caducidade se referisse ao estabelecimento da paternidade, então teria de ser a partir deste estabelecimento que se iniciaria a contagem do respectivo prazo. A circunstância de se considerar um prazo de caducidade que é anterior ao estabelecimento da paternidade mostra que essa caducidade só se pode referir ao direito a esse estabelecimento, e não a este mesmo estabelecimento.

Do exposto resulta que a caducidade só pode incidir sobre o direito ao estabelecimento da paternidade e que, por conseguinte, essa caducidade não pressupõe esse estabelecimento. Pelo contrário: só faz sentido conhecer da caducidade do direito ao estabelecimento da paternidade antes do estabelecimento da paternidade. Aquela caducidade destina-se a evitar o estabelecimento da paternidade, não a destruir ou a paralisar uma paternidade estabelecida.

Resta acrescentar que o acima afirmado vale para a invocação da excepção de caducidade contra qualquer direito potestativo que seja exercido em juízo (como, por exemplo, um direito à aquisição, à anulação, à revogação, à resolução ou à impugnação). A excepção de caducidade visa obstar ao exercício desse direito, não destruir ou paralisar a situação jurídica resultante desse exercício.

b) Nestes termos, não há qualquer problema em subscrever a afirmação de que nada obsta a que a excepção de caducidade "seja conhecida e julgada procedente antes da determinação dos factos constitutivos do direito intempestivamente exercido", ou seja, antes do estabelecimento da paternidade. Em todo o caso, são indispensáveis duas observações:

-- A caducidade não pode ser oposta a um direito ao estabelecimento da paternidade sem qualquer base factual, ou seja, fundamentado em factos sem relevância jurídica, ou feito valer por alguém sem legitimidade para tal; se o direito ao estabelecimento da paternidade invocado pelo autor não puder existir ou se este demandante não puder ser o seu titular, a caducidade não pode ser oposta a esse direito; ter-se-á de concluir que, no mínimo, a caducidade só é oponível a um direito ao estabelecimento potencialmente existente;

-- A caducidade não pode ser oposta a um direito ao estabelecimento da paternidade que se verificou não existir; depois de o tribunal ter concluído que a acção de investigação não pode ser julgada procedente, não é possível julgar a acção improcedente com fundamento na caducidade do direito ao estabelecimento; a caducidade não pode ser oposta a um direito ao estabelecimento inexistente, ou seja, a caducidade não é cumulável com nenhum outro fundamento de improcedência da acção. 


MTS


23/09/2015

Bibliografia (199)


-- Tatsachen - Verfahren - Vollstreckung / Festschrift für Isaak Meier zum 65. Geburtstag (Schulthess Verlag: Zürich 2015)


Jurisprudência constitucional (50)



Responsabilidade civil do Estado pelo exercício da função jurisdicional; 
necessidade de revogação da decisão danosa



1. TC 363/2015, DR 186/2015, II, de 23/9/2015: Não julga inconstitucional a norma do artigo 13.º, n.º 2, do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, segundo o qual o pedido de indemnização fundado em responsabilidade por erro judiciário deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela jurisdição competente.

2. A fundamentação do acórdão contém uma análise pormenorizada das posições que têm sido defendidas sobre o problema. A solução nele defendida -- aliás, discutível -- deve, entretanto, tomar em consideração a problemática referida no post Responsabilidade civil do Estado por erro judiciário; consequências de TJ 9/9/2015 (C‑160/14).

MTS



Jurisprudência constitucional (49)


Processo de insolvência; efeitos da declaração de insolvência; 
suspensão da prescrição; dívidas fiscais; devedor subsidiário


-- TC 362/2015, DR 186/2015, II, de 23/9/2015: Julga inconstitucional a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.  

Nota: o acórdão já tinha sido divulgado em Jurisprudência constitucional (46).

 

Jurisprudência europeia (TJ) (62)


Transportes aéreos; direitos dos passageiros em caso de atraso ou de cancelamento de um voo; Reg. 261/2004; recusa de embarque e cancelamento de um voo;atraso considerável de um voo; indemnização e assistência aos passageiros; circunstâncias extraordinárias



TJ 17/9/2015 (C‑257/14, van der Lans/Koninklijke Luchtvaart Maatschappij) decidiu:

O artigo 5.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 261/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, que estabelece regras comuns para a indemnização e a assistência aos passageiros dos transportes aéreos em caso de recusa de embarque e de cancelamento ou atraso considerável dos voos e que revoga o Regulamento (CEE) n.° 295/91, deve ser interpretado no sentido de que um problema técnico, como o que está em causa no processo principal, que ocorreu inesperadamente, que não é imputável a uma manutenção defeituosa e que não foi detetado durante um controlo regular, não está abrangido pelo conceito de «circunstâncias extraordinárias», na aceção desta disposição.


Jurisprudência (195)



Títulos executivos forever? (8)


1. O sumário de RP 10/9/2015 (9619/14.1T8PRT.P1) é o seguinte:

Conforme tem julgado o Tribunal Constitucional é inconstitucional, por violação do princípio da protecção da confiança decorrente do princípio do Estado de Direito democrático constante do artigo 2.º da Constituição, a norma resultante dos artigos 703.º do CPC e 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, na interpretação de que aquele artigo 703.º se aplica a documentos particulares emitidos em data anterior à da entrada em vigor do novo CPC e então exequíveis por força do artigo 46.º, n.º 1, alínea c), do CPC de 1961, pelo que as execuções instauradas depois da entrada em vigor do novo CPC com base em documentos emitidos antes e que na data da sua emissão tinham valor de título executivo devem ser recebidas por o documento manter esse valor. 


2. Sobre o problema cf. Jurisprudência constitucional (48), bem como Jurisprudência constitucional (32) e respectiva nota.

MTS


22/09/2015

Bibliografia (198)


-- Soveral Martins, A. de, Arbitragem e propriedade industrial: medicamentos de referência e medicamentos genéricos, RLJ 144 (2015), 418

-- van Rhee, C. H./Uzelac, A., Evidence in Contemporary Civil Procedure / Fundamental Issues in a Comparative Perspective (Intersentia: Antwerp/Cambridge 2015)

Legislação europeia (Projectos e propostas) (10)



Reg. 2201/2003

Para informações sobre a revisão do Reg. 2201/2003 (Brussels IIa: Towards a Review) clicar em PE 536.451.


Legislação (41)


-- P 301/2015, de 22/9: Fixa a taxa de arbitragem e dos encargos do processo no âmbito da arbitragem necessária [pelo Tribunal Arbitral do Desporto], bem como das taxas relativas a atos avulsos, nos termos da Lei n.º 74/2013, de 6 de setembro, alterada pela Lei n.º 33/2014, de 16 de junho


Jurisprudência (194)




Providências cautelares; garantia autónoma; medida da prova;
inversão do contencioso necessária


1. O sumário de RL 8/9/2015 (74/14.7T8LSB.L1-7) é o seguinte: 

I - A autonomia da garantia, designadamente, da garantia automática ou à primeira solicitação, face ao contrato base, não é absoluta, já que, em caso de fraude manifesta ou abuso evidente por parte do beneficiário, o garante pode e deve mesmo recusar-se a pagar a garantia, porquanto, acima da regra acordada pelas partes, estão os princípios da boa fé e da proibição do abuso do direito.
 
II – Assim, pretendendo o devedor lançar mão de medidas cautelares destinadas a impedir o beneficiário de receber a garantia, o êxito final dessas medidas, que constituem, inquestionavelmente, um excepcional meio de defesa, dependerá da prova inequívoca do comportamento manifestamente fraudulento ou abusivo do beneficiário.
 
III - O que vale por dizer que, no âmbito da garantia autónoma, sempre que a providência cautelar seja requerida como forma de obstar a um aproveitamento abusivo da posição do beneficiário, deve ser exigida prova pronta e líquida, sendo, pois, insuficiente a consideração do simples
fumus bonus iuris, típico das providências cautelares, sob pena de violação da essência da garantia autónoma à primeira solicitação.
 
IV – A fraude manifesta e o abuso evidente implicam a prova pronta e líquida, sendo que, a prova é pronta (preconstituída) quando não se mostra necessário requerer a produção de provas suplementares e é líquida (inequívoca) quando permite a percepção imediata e segura da fraude ou do abuso, tornando-os óbvios.
 

2. Convém conhecer o seguinte trecho do acórdão:

"Não obstante se tratar de garantia autónoma, a doutrina e a jurisprudência reconhecem a possibilidade de o garante recusar o pagamento, quer a solicitação do beneficiário se traduza numa fraude, quer se traduza num abuso de direito.

Todavia, não reconhecem essa possibilidade em termos absolutos, já que tem sido unanimemente defendido que não basta ao garante a suspeita de fraude ou de abuso de direito, antes se exigindo que o carácter não fundado da solicitação seja claro e não contestável.

Assim, a autonomia da garantia face ao contrato-base não é absoluta, já que se tem entendido, quer na doutrina, quer na jurisprudência, que, em caso de fraude manifesta ou abuso evidente por parte do beneficiário, o banco pode e deve mesmo recusar-se a pagar a garantia.

Trata-se, pois, de uma excepção à regra de que o banco deve prestar de imediato a garantia logo que solicitada pelo beneficiário, já que, acima daquela regra acordada pelas partes, estão os princípios da boa fé e da proibição do abuso do direito (cfr. os arts.762º, nº 2, e 334º do C.Civil).

Questão é que o abuso ou a fraude sejam inequívocos, pois que, se bastasse ao banco alegar o abuso ou a fraude do beneficiário, fazendo depender a sua prova de diligências ulteriores, frustrar-se-ia, afinal, o objectivo das garantias, acabando por virem a ser pagas só depois de largas controvérsias, quando o seu escopo é precisamente evitar essa situação.

Exige-se, deste modo, que a fraude ou o abuso sejam manifestos, fazendo-se depender, por isso, a possibilidade de recusa do garante do facto de este ter em seu poder prova pronta e líquida da fraude ou do abuso do beneficiário.

Mas pode acontecer (e parece que acontece frequentemente) que o banco, por não querer envolver-se em disputas e até por uma questão de reputação, não conteste a pretensão do beneficiário e antes preste a garantia logo que solicitada.

Ora, tem-se entendido que, para fazer face a este inconveniente, que prejudica o devedor, este tem a possibilidade de lançar mão de medidas cautelares destinadas a impedir o beneficiário de receber a garantia.

Porém, o êxito final dessas medidas, que constituem, inquestionavelmente, um excepcional meio de defesa, dependerá da prova inequívoca do comportamento manifestamente fraudulento ou abusivo do beneficiário.

Isto é, só podem ser requeridas no caso de o devedor possuir provas inequívocas de abuso evidente por parte do beneficiário, caso contrário, só depois de paga a garantia é que o devedor agirá contra o beneficiário, em ordem a ser reembolsado da quantia indevidamente recebida por este, se for caso disso.

O que vale por dizer que, no âmbito da garantia autónoma, sempre que a providência cautelar seja requerida como forma de obstar a um aproveitamento abusivo da posição do beneficiário, deve ser exigida prova pronta e líquida (cfr. Mónica Jardim, ob.cit. 
[A Garantia Autónoma (2002)], pág.336).

Contudo, é sabido que nas providências cautelares, dado o seu carácter urgente e provisório, em lugar da prova do direito, o juiz deve contentar-se com a probabilidade séria da existência do direito, devendo o requerente oferecer prova sumária do direito ameaçado (cfr. os arts. 365º, nº 1, e 368º, nº 1, do C.P.C.).

Por isso que já se sustentou que, subordinar a concessão da providência à apresentação de prova pronta e líquida, significaria pretender corrigir a lei processual que consagra a regra da suficiência da prova sumária para efeitos de concessão de providências cautelares (cfr. Mónica Jardim, ob.cit., pág. 335).

Segundo esta autora, as jurisprudências alemã e austríaca manifestaram-se contra esta objecção, sendo depois seguidas pela demais jurisprudência internacional, que exige a apresentação de prova pronta e líquida da fraude do beneficiário, ou seja, o mesmo tipo de prova que é exigido no âmbito da excepção de fraude manifesta a opor pelo garante, fundamentando essa exigência com recurso àquilo a que chama uma «regra restritiva de direito jurisprudencial», imposta pela função da garantia autónoma.

Considera a mesma autora, ob.cit., pág.337, que a prova pronta e líquida da fraude ou abuso evidente do beneficiário deve ser tida como indispensável, uma vez que está em causa o cumprimento de um contrato de garantia, cuja autonomia não se coaduna com o deferimento de providências senão em situações excepcionais, e que seria excessivamente relativizada caso fosse suficiente uma prova meramente sumária ou indiciatória, com base na qual o juiz pudesse fazer um simples juízo de probabilidade.

Entende, assim, que os citados preceitos do C.P.C. não devem valer quando esteja em jogo uma garantia autónoma e a providência cautelar seja requerida como forma de obstar a um aproveitamento abusivo da posição do beneficiário, caso em que deve ser considerado insuficiente um simples fumus bonus iuris, pois só assim se negará ao devedor a possibilidade de obter, por via cautelar, o que o garante não pode obter por via da contestação à solicitação.

Concorda-se com tal entendimento, caso contrário estar-se-ia a violar a essência da garantia autónoma, frustrando-se a sua finalidade e o lema a que, fundamentalmente, obedece: pagar primeiro e discutir depois."

3. A orientação defendida no acórdão é compreensível atendendo a uma característica essencial do direito processual civil: a sua posição instrumental perante o direito substantivo. Desta instrumentalidade decorre, sem dúvida, que o direito processual civil não pode contrariar os valores substantivos. Portanto, se a prestação correspondente a uma garantia autónoma só pode deixar de ser realizada perante a prova do comportamento fraudulento e abusivo do beneficiário, não pode ser decretada uma providência cautelar destinada a evitar a realização dessa prestação sem essa mesma prova.


O ponto mais interessante que o acórdão levanta não foi -- nem tinha de ser -- tratado no mesmo. A questão é a seguinte: depois de o tribunal ter considerado a providência cautelar procedente com base numa prova stricto sensu que tenha demonstrado o comportamento fraudulento ou abusivo do beneficiário da garantia autónoma, o que se lhe pode seguir?

Em teoria, depois do procedimento cautelar no qual tenha sido decretado a providência cautelar deveria ser proposta a acção principal, sob pena de caducidade da providência decretada (art. 364.º, n.º 1, e 373.º, n.º 1, al. a), CPC). Parece evidente, no entanto, que, depois de se ter demonstrado, através de uma prova stricto sensu, a conduta fraudulenta e abusiva do beneficiário da garantia autónoma, nada resta para demonstrar numa subsequente acção principal. Nesta acção -- destinada a provar que o beneficiário não tem direito à prestação decorrente da garantia autónoma -- só poderia ser duplicada a prova realizada no anterior procedimento cautelar. Depois de ter sido decretada uma providência cautelar que determina, com base numa prova stricto sensu, que o beneficiário não tem direito à prestação decorrente da garantia autónoma não é justificada a propositura de uma acção destinada a obter o mesmo efeito com base na mesma prova: esta acção seria sempre inútil. A excepção de caso julgado permite evitar esta duplicação de meios processuais (cf. art. 580.º, n.º 2, CPC).

Parece assim dever concluir-se que a exigência da referida prova stricto sensu no procedimento cautelar implica necessariamente a inversão do contencioso. Em comparação com a situação normal -- na qual é o requerente da providência que opta por requerer a inversão do contencioso (cf. art. 369.º, n.º 1, CPC), não tendo, no entanto, nenhum ónus de o fazer --, na hipótese de o requerente pretender obstar ao funcionamento de uma garantia autónoma a favor do beneficiário só lhe resta instaurar uma providência cautelar que, ao exigir uma prova stricto sensu dos fundamentos da providência, determina necessariamente uma inversão do contencioso. O que pode fundamentar o decretamento da providência não é uma probabilidade séria da existência do direito do requerente (cf. art. 368.º, n.º 1, CPC), mas a prova desse direito.

Isto demonstra que a inversão do contencioso pode ser necessária, no sentido de que essa inversão se impõe ao requerente e ao tribunal e de, portanto, dispensa qualquer pedido do requerente da providência: é o que sucede quando àquele requerente é exigida uma prova stricto sensu dos factos constitutivos da providência cautelar e quando este órgão só pode decretar a providência se esta prova for realizada. Dito de outro modo: ao contrário da inversão do contencioso voluntária -- que não tem de ser nem pedida, nem proferida em conjunto com o decretamento da providência cautelar --, a inversão do contencioso é necessária quando a providência cautelar só pode ser pedida e decretada em conjunto com essa inversão.

A inversão do contencioso necessária produz todos os efeitos desta inversão, nomeadamente o de impor ao requerido o ónus de propositura de uma acção de impugnação, sob pena de consolidação da providência decretada pelo tribunal (cf. art. 371.º, n.º 1, CPC). 

4. As reflexões anteriores não podem deixar de suscitar outras reflexões. Uma delas é a seguinte: dado que, em casos como o apreciado no acórdão, a providência cautelar só pode ser decretada se for provado (em termos de prova stricto sensu) o fundamento dessa providência, cabe perguntar se o próprio procedimento cautelar é admissível ou se o interessado tem afinal de instaurar uma acção. Pode argumentar-se que, se o que se exige é uma prova stricto sensu, então o interessado tem de propor uma acção, porque esse é a medida de prova própria de qualquer acção.

Crê-se, no entanto, que não há fundamento para recusar a admissibilidade do procedimento cautelar, desde que a situação seja vista como uma inversão de contencioso necessária. Esta construção garante que o requerente não pode propor posteriormente nenhuma acção sobre o mesmo objecto (a tal obsta a excepção de caso julgado: cf. art. 580.º e 581.º CPC), mas, acima de tudo, assegura que o requerido pode evitar a consolidação da providência decretada através de uma acção de impugnação (cf. art. 371.º, n.º 1, CPC). Isto permite equilibrar a posição das partes: o requerente obtém, através de um procedimento cautelar, uma tutela cautelar que é potencialmente definitiva mais depressa do que obteria uma tutela definitiva através de uma acção, mas o requerido pode obstar à consolidação daquela tutela como tutela definitiva através de uma acção de impugnação.
 
Um outro problema que o caso em análise suscita é o de saber se existirão outros casos de inversão de contencioso necessária. A resposta (teórica) que se pode dar é a de que não se pode excluir que existam outras situações de inversão de contencioso necessária, de acordo com o critério acima referido: a inversão do contencioso é necessária sempre que a medida de prova exigida para todos os fundamentos da providencia seja a prova stricto sensu.

Isto não exclui que, mesmo sem se verificar qualquer inversão do contencioso necessária, alguns desses fundamentos também possam exigir uma prova stricto sensu, ou seja, requeiram uma medida de prova maior do que a normal mera justificação (cf. art. 368.º, n.º 1, CPC). Pense-se, por exemplo, no caso em que, para o decretamento de uma providência cautelar, é necessário determinar se houve uma declaração tácita de uma das partes; para que se verifique uma declaração tácita é necessário que a mesma possa ser deduzida de "factos que, com toda a probabilidade, a revelam" (art. 217.º, n.º 1, CC); pode então perguntar-se se, num procedimento cautelar, o tribunal pode considerar que se verificou uma declaração tácita, apesar de esse mesmo tribunal não ter adquirido a convicção segura de que os factos que a podem revelar se verificaram ou não ter ter conseguido inferir desses factos, "com toda a probabilidade", aquela declaração; a resposta parece dever ser negativa. 

Algo de semelhante se pode dizer se, num procedimento cautelar, for necessário determinar o termo da curadoria pela certeza da morte do ausente (cf. art. 98.º, al. e), e 112.º, al, c), CC) ou a não verificação de uma condição pela certeza de que a mesma não se pode verificar (cf. art. 275.º, n.º 1, e 2237.º, n.º 1, CC). Nenhuma destas certezas pode ser substituída num procedimento cautelar por uma probabilidade séria.

5. Pode concluir-se que, apesar de, nos procedimentos cautelares, a regra ser a suficiência de uma mera justificação (cf. art. 368.º, n.º 1, CPC), a medida de prova exigida pelo direito substantivo (ou pelos valores do direito substantivo) tem de ser respeitada nos procedimentos cautelares. No caso mais extremo -- que é aquele em que todos os fundamentos da providência cautelar requerem uma prova stricto sensu --, isso conduz a uma inversão do contencioso necessária. 
 

MTS


21/09/2015

Jurisprudência (193)


Alteração do rol de testemunhas


RC 8/9/2015 (2035/09.9TBPMS-A.C1) decidiu o seguinte: 

O prazo de 20 dias a que alude o art. 598.º, n.º 2, do CPC refere-se à data da efetiva realização da audiência de discussão e julgamento, pelo que a possibilidade de alteração ou aditamento do rol de testemunhas como que se “renova” relativamente a cada uma das novas marcações que venham a ter lugar.
 
 

19/09/2015

Jurisprudência europeia (TJ) (61)


Reenvio prejudicial; contexto factual e legal do litígio principal; 
omissão de referências precisas; inadmissibilidade manifesta


-- TJ 3/9/2015 (C‑250/15, Vivium/Belgische Staat): inadmissibilidade de reenvio prejudicial por falta de referência precisa ao contexto factual e legal do litígio principal.


Legislação europeia (13)


-- Decisão (UE, Euratom) 2015/1566 dos Representantes dos Governos dos Estados-Membros, de 16 de setembro de 2015, que nomeia quatro juízes e um advogado-geral do Tribunal de Justiça, JO L 244 de 19/9/2015

 

18/09/2015

Jurisprudência europeia (TJ) (60)



Notificação dos atos judiciais e extrajudiciais; Reg. 1393/2007; recusa de receção do ato; inexistência de tradução de um dos documentos transmitidos; falta do formulário tipo constante do Anexo II do Reg. 1393/2007


1. TJ 16/9/2015 (C‑519/13, Alpha Bank Cyprus/Dau Si Senh et al.) decidiu o seguinte:

O Regulamento (CE) n.° 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados‑Membros («citação e notificação de atos») e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1348/2000 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que:

– a entidade requerida está obrigada, em qualquer circunstância e sem margem de apreciação a este respeito, a informar o destinatário do ato do seu direito de recusar a receção do mesmo, utilizando sistematicamente para o efeito o formulário tipo constante do Anexo II do referido regulamento; e

– a circunstância de a entidade requerida, quando procede à notificação de um ato ao seu destinatário, não ter juntado o formulário tipo constante do Anexo II do Regulamento n.° 1393/2007 não constitui um fundamento de nulidade do processo, mas uma omissão que deve ser regularizada em conformidade com o disposto no referido regulamento.

2. Cf. Franzina,The ECJ on the binding use of standard forms under the Service Regulation, Conflict of Laws. net.


Jurisprudência uniformizada (16)


Acidente de viação; abandono do sinistrado; direito de regresso


-- Ac, STJ 11/2015, de 18/9: O direito de regresso da seguradora contra o condutor que haja abandonado dolosamente o sinistrado, previsto na parte final da alínea c) do art. 19.º do DL 522/85, de 31/12, não está limitado aos danos que tal abandono haja especificamente causado ou agravado, abrangendo toda a indemnização paga ao lesado com fundamento na responsabilidade civil resultante do acidente.

Informação (85)



Responsabilidade civil pelo exercício de funções jurisdicionais


Em Studio Cataldi é possível encontrar uma informação sobre a actual situação em Itália quanto à responsabilidade civil decorrente do exercício de funções jurisdicionais.

Bibliografia (197)


-- Honorati, C., La prassi italiana sul ritorno del minore sottratto ai sensi dell'art. 11 par. 8 del regolamento Bruxelles II-bis, RDIPP 51 (2015), 275
 
-- Marino, S., La portata della proroga del foro nelle controversie sulla responsabilità genitoriale, RDIPP 51 (2015), 349
 
 
 
 

A revogação tácita dos art. 1808.º, n.º 4, 1810.º, 1841.º, n.º 4, e 1865.º, n.º 5, CC


1. A L 141/2015, de 8/9, aprova o Regime Geral do Processo Tutelar Cível (art. 1.º) e revoga, além do mais, a OTM (art. 6.º, al. a)).

Uma das novidades do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC, na abreviatura oficial: art. 1.º RGPTC) é a desjudicialização da decisão sobre a viabilidade da acção de investigação da maternidade ou paternidade após a instrução do processo de averiguação oficiosa dessa mesma maternidade ou paternidade. No regime ainda vigente, essa decisão cabe ao juiz, que, caso considere que essa acção tem probabilidade de vir a ser bem sucedida, remete o processo para o agente do Ministério Público, para que este proponha a referida acção (art. 1808.º, n.º 4, e 1810.º CC); no regime instituído pelo RGPTC, essa decisão passa a caber ao agente do Ministério Público, que, na hipótese de concluir  pela viabilidade da acção da investigação, propõe esta mesma acção (art. 62.º, n.º 1, RGPTC).

Em parte alguma se encontra uma revogação expressa dos art. 1808.º, n.º 4, e 1810.º CC ou a sua substituição por regras compatíveis com o novo regime que consta do RGPTC. Parece seguro, no entanto, que o disposto naqueles preceitos é incompatível com o estabelecido no art. 62.º, n.º 1, RGPTC, pelo que há que concluir que, tal como resulta do art. 7.º, n.º 2, CC, a entrada em vigor do RGPTC (cf. art. 7.º L 141/2015) implicará necessariamente a revogação tácita daqueles preceitos.

Resta acrescentar que a revogação tácita do art. 1810.º CC deixa sem regulação específica a situação em que da instrução do processo tutelar cível resulta que o filho nasceu ou foi concebido na constância do matrimónio da mãe. Isso, no entanto, não pode afastar a aplicação do disposto no art. 1822.º CC, dado que, nessa hipótese, o estabelecimento da maternidade a favor da mãe casada faz funcionar a presunção de paternidade do seu marido (cf. art. 1826.º, n.º 1, CC), pelo que importa permitir que, ao mesmo tempo que se estabelece a maternidade, se possa impugnar a paternidade presumida (cf. art. 1823.º, n.º 1, CC).

2. O mesmo há que afirmar quanto ao disposto no art. 1841.º, n.º 4, CC, no âmbito da acção de impugnação da paternidade, e no art. 1865.º, n.º 5, CC, quanto à averiguação oficiosa da paternidade. Também estes preceitos serão revogados tacitamente com a entrada em vigor do RGPTC, por incompatibilidade com o disposto no art. 62.º, n.º 1, RGPTC.

O art. 1841.º, n.º 3, CC -- que atribui ao tribunal, na acção de impugnação de paternidade, competência para proceder às diligências necessárias para averiguar a viabilidade da acção -- pode ser objecto de uma interpretação actualista, entendendo-se que a referência ao tribunal deve ser substituída, por imposição do art. 60.º, n.º 1, RGPTC, por uma referência ao Ministério Público.

3. A ter-se razão no que acima se afirma, verificar-se-ão em breve várias revogações tácitas no CC. Pode dizer-se -- o que é, aliás, indiscutível -- que o sistema vai funcionar adequadamente e vai evitar quaisquer desarmonias de regimes. Mas também se deve concluir que o CC é um diploma demasiado importante para que possa admitir como desejável a revogação tácita de qualquer das suas disposições.

MTS


17/09/2015

Jurisprudência estrangeira (2)


Acidente de viação; exclusão da responsabilidade

OLG Frankfurt a.M. 18/8/2015 (22 U 39/14) decidiu o seguinte:

Se vários condutores de motociclos conduzem, de comum acordo, em grupo, sem observar entre eles as distâncias de segurança, verifica-se a exclusão de qualquer responsabilidade na hipótese em que o terceiro condutor colide com o segundo, depois de o primeiro ter causado um acidente e de nenhum deles ter conseguido travar a tempo, pelo que o segundo condutor não tem qualquer pretensão contra o terceiro.



Legislação (40)


-- P 288/2015, de 17/9: Segunda alteração à Portaria n.º 331-A/2009, de 30 de março, que regulamenta os meios eletrónicos de identificação do executado e dos seus bens e da citação eletrónica de instituições públicas, em matéria de ação executiva


Jurisprudência (192)


Competência material; responsabilidade civil


O sumário de RP 8/7/2015 (543/13.6TBPNF.P1) é o seguinte:

I - Constitui entendimento corrente da doutrina e da jurisprudência que a competência do tribunal, como pressuposto processual que é, determina-se pelos termos em o autor estruturou o pedido e a causa de pedir.

II - A competência traduz-se na medida de jurisdição atribuída a cada tribunal, assentando a competência material na natureza do litígio.

III - Os tribunais da ordem administrativa tem competência para administrar nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas.

IV - A relação jurídica administrativa é aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares ou que atribui direitos ou impõe deveres públicos aos particulares perante a Administração.

V - Os tribunais judiciais têm uma competência residual, pois são da sua competência as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

VI - A relação que se estabeleceu entre o notário, profissional liberal, e o apelante, particular que recorreu aos seus serviços para celebrar uma escritura pública, não é seguramente uma relação de direito administrativo, mas sim uma relação de direito privado, para cuja apreciação são competentes os tribunais judiciais, por não ser enquadrável em nenhuma das alíneas do artigo 4,º ETAF, que delimitam a competência dos tribunais administrativos.
 
 

16/09/2015

Bibliografia (196)


-- Mouraz Lopes, J., Separação de poderes e criação do Direito: alguns tópicos para reflexão - Discurso de abertura das III Jornadas Açorianas de Direito, Julgar 25 (2015), 11

-- Taruffo, M., A jurisprudência entre a casuística e a uniformidade, Julgar 25 (2015), 19

-- Andrés Ibañez, P., Separación de poderes y creación judicial del derecho hoy, Julgar 25 (2015), 29

-- Vives Martinez, G., Dação em pagamento nas execuções hipotecárias e abuso de direito, Julgar 25 (2015), 65

-- Dann, M., Durchsuchung und Beschlagnahme in der Anwaltskanzlei, NJW 2015, 2609


 

Jurisprudência (191)


Erro sobre o regime processual aplicável;
aplicação da lei no tempo

 

O sumário de STJ 26/6/2015 (818/07.3TBAMD.L1.S1) é o seguinte:

1. Por força do art. 7º, nº 1, da Lei nº 41/2013, de 26-6, em acções instauradas antes de 1-1-2008 aos recursos interpostos de decisões proferidas após 1-9-2013 (data da entrada em vigor do NCPC) é aplicável o regime do NCPC, com excepção das normas referentes a situações de dupla conforme.

2. Atento o disposto no art. 3º da Lei nº 41/2013, relativamente a actos praticados durante o primeiro ano de vigência do NCPC eivados de erro quanto à determinação do regime aplicável, o juiz deve intervir oficiosamente para que, na medida do possível, seja suprida a falha verificada.

3. Apresentadas no referido período transitório alegações de recurso marcadas por erro na determinação do regime aplicável, se a Relação considerar que as mesmas estavam viciadas por “falta de conclusões”, em lugar da rejeição imediata do recurso que é cominada pelo art. 639º, nº 3, do NCPC, cumpre ao relator proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento nos termos previstos no art. 690º, nº 3, do CPC de 1961, na redacção anterior ao Dec. Lei nº 303/2007.

4. A reprodução nas “conclusões” do recurso da respectiva motivação não equivale a uma situação de alegações com “falta de conclusões”, de modo que em lugar da imediata rejeição do recurso, nos termos do art. 641º, nº 2, al. b), do NCPC, é ajustada a prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas, nos termos do art. 639º, nº 3, do NCPC.



15/09/2015

Legislação (39)


-- L 155/2015, de 15/9: Aprova o Estatuto da Ordem dos Notários, em conformidade com a Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais, revoga o Decreto-Lei n.º 27/2004, de 4 de fevereiro, e procede à terceira alteração ao Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2004, de 4 de fevereiro


Responsabilidade civil do Estado por erro judiciário; consequências de TJ 9/9/2015 (C‑160/14)


1. Já houve a oportunidade de divulgar e de chamar a atenção para a importância de TJ 9/9/2015 (C‑160/14, Ferreira da Silva e Brito et al./Estado português) (cf. Jurisprudência europeia (TJ) (61)). Volta-se agora ao tema para algumas reflexões complementares.

Após o acórdão do TJ parece claro que, sempre que numa acção de responsabilidade civil proposta contra o Estado, seja invocado um erro judiciário por violação do direito europeu, não pode ser exigida, ao contrário do que dispõe o art. 13.º, n.º 2, RRCEE, a prévia revogação da decisão que alegadamente contém aquele erro.

Isto coloca a necessidade de avaliar a vantagem (ou a possibilidade) de manter o requisito da revogação da decisão que alegadamente contém o erro judiciário, quando este não incida sobre a interpretação ou a aplicação de direito europeu. Uma resposta afirmativa a esta questão é mais do que duvidosa, fundamentalmente por três razões:

-- Primeiro, porque origina uma duplicidade de regimes para o erro judiciário por violação do direito europeu (em que a prévia revogação da decisão não pode ser exigida) e para o erro por violação do direito interno e do direito decorrente de convenções internacionais (em que aquela revogação continuaria a ser requerida);

-- Segundo, porque exige colmatar a actual lacuna que se verifica no ordenamento jurídico português, dado que, neste momento, não se prevê nenhuma forma de impugnar, com fundamento em alegado erro judiciário, uma decisão que não é impugnável por recurso ordinário (nomeadamente, por motivo da alçada ou da circunstância de a decisão provir do STJ ou do STA);

-- A isto acresce, num plano mais geral, que a exigência da revogação prévia da decisão alegadamente errada subverte o sentido da indemnização que o lesado pretende obter do Estado; o que este lesado quer é ser ressarcido dos danos provocados por uma decisão ilegal, não afastar esta mesma decisão do ordenamento jurídico; aliás, a exigência da prévia revogação da decisão como pressuposto da responsabilidade do Estado não deixa, num certo sentido, de ser algo contraditória, porque estabelece como requisito da responsabilidade a supressão da própria fonte da responsabilidade (o que, pelo menos na grande maioria dos casos, tem como consequência que só poderão ser indemnizados os danos provocados entre o proferimento e a revogação da decisão).

2. Ainda assim, pode ensaiar-se a continuação da exigência da referida revogação (mesmo que se mantenha excluída desta exigência a alegada violação do direito europeu). Neste contexto, tem interesse voltar ao caso concreto. Após o proferimento do acórdão do TJ, não fosse encontrar-se ultrapassado o prazo estabelecido no art. 697.º, n.º 1, CPC, estaria aberta a possibilidade da interposição de um recurso de revisão contra STJ 25/2/2009 (08S2309) com fundamento no disposto no art. 696.º, al. f), CPC.
 
Apesar disto, parece dever concluir-se que a via para obter a revogação do acórdão que contém o erro judiciário exigida pelo art. 13.º, n.º 2, RRCEE não pode ser a que acabou por ser seguida no caso concreto, em conjugação com a interposição de um recurso de revisão de acordo com o disposto no art. 696.º, al. f), CPC. Recorde-se que o iter foi o seguinte:

-- Propositura de uma acção de indemnização contra o Estado por alegado erro judiciário de STJ 25/2/2009 (as afirmações de que "o juiz nacional não pode efectuar um reenvio que tenha por objecto [...] aferir da compatibilidade entre um preceito de direito interno e outro de direito comunitário" e de que "não se insere [...] na competência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias saber se determinado normativo de direito comunitário é, ou não, aplicável (ainda que não directamente) a uma dada situação sobre a qual se debruçam os tribunais nacionais dos vários Estados Membros" não podem ser efectivamente acolhidas);

-- Formulação do pedido de apreciação prejudicial do TJ pelo tribunal no qual a acção de responsabilidade tenha sido proposta;

-- Confirmação pelo TJ do erro judiciário constante da decisão, o que, no plano teórico, abre a hipótese da interposição de um recurso de revisão com fundamento no disposto no art. 696.º, al. f), CPC.

Independentemente do que se pense, em termos de estratégia processual, sobre este iter, a verdade é que o objectivo do lesado não é impugnar a decisão alegadamente ilegal, mas antes obter uma indemnização por responsabilidade civil com base nessa mesma decisão. Dito de outro modo: o lesado não pretende obter a substituição da decisão alegadamente errada por uma outra decisão (como sucede no recurso de revisão), mas antes ser indemnizado pelos danos causados por essa decisão.

Além disto, o referido iter só poderia ser  seguido nos casos em que fosse invocada uma violação de direito europeu. Ora, conforme se referiu acima, para esta situação o TJ já definiu que não pode ser exigida a prévia revogação da decisão. Isto significa que, daqui em diante, bastará a qualquer interessado invocar que, segundo a jurisprudência do TJ, a acção de indemnização baseada em erro judiciário por violação do direito europeu não exige a prévia revogação da decisão pretensamente ilegal.

Resta ponderar a possibilidade de alargar a faculdade de interposição do recurso de revisão às hipóteses de alegado erro judiciário na interpretação ou aplicação de direito interno ou de direito internacional convencional. O principal problema desta solução (mesmo esquecendo a distinção quanto à origem do erro a ela subjacente) é aquele que já acima foi referido: o que o lesado pretende conseguir é a indemnização dos danos sofridos com a decisão alegadamente ilegal, não a supressão desta decisão. Aliás, muito frequentemente a revogação da decisão é absolutamente irrelevante para o lesado: se, por exemplo, uma decisão sobre o despejo de um imóvel foi proferida com base num erro de direito, o que o lesado pretende obter é uma indemnização pelo erro judiciário, não a revogação da decisão e a sua posterior substituição por qualquer outra (que, aliás, nunca conseguiria colocar o inquilino despejado como se não tivesse sido despejado).

3. Pelo acima exposto, a melhor solução seria mesmo a revogação da exigência da revogação da decisão na qual foi alegadamente cometido o erro judiciário como pressuposto da responsabilidade do Estado perante o lesado. Para salvaguardar a eventualidade em que o erro conste de um acórdão de uma das Relações ou do próprio STJ, poder-se-ia estabelecer o princípio de que, nas acções de responsabilidade propostas com base em erro judiciário, seria sempre admissível a interposição de recurso até ao STJ (podendo ainda discutir-se a formação de Desembargadores ou de Conselheiros a que seria atribuída competência para a apreciação do recurso de apelação ou de revista nessas acções).

MTS