"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



10/07/2015

Jurisprudência (168)


Dupla conforme; recurso subordinado


O sumário de STJ 4/6/2015 (1166/10.7TBVCD.P1.S1) é o seguinte:

I - Apesar de as instâncias terem coincidido quanto à determinação do momento do início da contagem dos juros de mora, se a Relação aumentou, em relação à decisão da 1.ª instância, as indemnizações a que os juros respeitam, tal não chega para se afirmar existir dupla conformidade.

II - Ainda que assim não fosse, aplicar-se-ia, por analogia, o regime previsto pelo n.º 5 do art. 6[33].º do NCPC (2013) para a eventualidade de ser interposto recurso principal e de se questionar a possibilidade de recurso subordinado, por falta de sucumbência suficiente: sendo admissível a revista principal, é admissível a revista subordinada, ainda que quanto a esta, haja dupla conforme.

III - O critério fundamental para a fixação, tanto das indemnizações atribuídas por danos patrimoniais futuros (vertente patrimonial do chamado dano biológico) como por danos não patrimoniais (dano biológico e demais danos não patrimoniais), é a equidade.

IV - A utilização de critérios de equidade não impede que se tenham em conta as exigências do princípio da igualdade. A prossecução desse princípio implica a procura de uma uniformização de critérios, naturalmente não incompatível com a devida atenção às circunstâncias do caso.

V - Os critérios seguidos pela Portaria n.º 377/2008, de 26-05, com ou sem as alterações introduzidas pela Portaria n.º 679/2009, de 25-06, destinam-se expressamente a um âmbito de aplicação extra-judicial e, se podem ser ponderados pelo julgador, não se sobrepõem ao critério fundamental para a determinação judicial das indemnizações fixado pelo Código Civil.

VI - É sabido que a limitação funcional, ou dano biológico, em que se traduz uma incapacidade é apta a provocar no lesado danos de natureza patrimonial e de natureza não patrimonial.

VII - Os danos patrimoniais futuros decorrentes de uma lesão física não se reduzem à redução da capacidade de trabalho, já que, antes de mais, se traduzem numa lesão do direito fundamental do lesado à saúde e integridade física, pelo que não pode ser arbitrada uma indemnização que apenas tenha em conta aquela redução e a perda de rendimento que dela resulte, ou a necessidade de um acréscimo de esforço para a evitar.

VIII - Para calcular a compensação a atribuir por danos não patrimoniais, nos termos do n.º 1 do art. 496.º do CC, o tribunal decide segundo a equidade, tomando em consideração “o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso”, o que, desde logo, revela a natureza também sancionatória da obrigação de indemnizar.

IX - Tendo ficado provado que as sequelas decorrentes de um acidente ocorrido em 2005 determinaram para a autora, então com 17 anos de idade, uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 16,9 pontos – e, por isso, com efectiva repercussão na actividade laboral –, nada há a censurar à utilização de tabelas e à introdução das correcções habitualmente citadas na jurisprudência, nem ao recurso ao valor de € 800,00 ilíquido auferido pela lesada a título de salário, a partir de 2013, para fixar o valor da indemnização devida por danos patrimoniais futuros em € 55 000,00, como decidiu a Relação.

X - Tendo em consideração: (i) as circunstâncias do acidente, o sofrimento que implicou, os tratamentos médicos, intervenções, internamentos e períodos que se lhe seguiram que se prolongaram no tempo, tendo a lesada apenas tido alta mais de 4 anos depois do acidente; (ii) a repercussão não patrimonial da incapacidade parcial permanente fixada à autora; (iii) as sequelas do acidente, as repercussões estéticas, as dores e demais sofrimento que se prolongarão pela vida da autora, que à data do acidente era saudável e tinha apenas 17 anos, e, finalmente; (iv) o grau de culpa da condutora do veículo causador do acidente que resultou de uma infracção séria às regras de circulação automóvel, traduzidas no desrespeito de um sinal de stop colocado à entrada de um cruzamento, mostra-se ajustado fixar a indemnização devida à autora por danos não patrimoniais em € 40 000,00, como decidiu a Relação.

XI - Para o cálculo da referida indemnização, não se mostra adequado o confronto com a indemnização pela perda do direito à vida, cuja razão de ser é claramente diferente daquela que justifica a indemnização ao lesado que sobrevive a um acidente, do qual resulta para ele sofrimentos e sequelas mais ou menos significativas.

XII - Tendo a sentença declarado expressamente que o cálculo que efectuou para a determinação dos montantes indemnizatórios foi actualizado, e tendo o acórdão recorrido confirmado esta decisão, louvando-se no AUJ n.º 4/2002, deve o início da contagem dos juros ser reportado à data da decisão e não à data da citação.

2. O acórdão entende que o recurso subordinado é admissível, mesmo que se verifique uma situação de dupla conforme para a parte que pode interpor este recurso. Esta orientação acompanha aquela que, há algum tempo, foi defendida num post publicitado neste Blog: cf. Dupla conforme e recurso subordinado.

MTS