"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



23/07/2015

Jurisprudência (176)



Princípio da cooperação das partes; violação do princípio



1. O sumário de RE 25/6/2015 (2168/09.1TBSTR-I.E1) é o seguinte:

Viola o princípio da cooperação processual (sendo, por isso, passível de incorrer em multa), a parte que, apesar de responder à solicitação do Tribunal, o faz de forma manifestamente desajustada, fugindo à questão, apenas para que não se diga que não respondeu.
2. Da fundamentação do acórdão consta o seguinte trecho:
"[...] a questão que se coloca resume-se a aferir do acerto da decisão recorrida: houve (ou não) violação do dever de cooperação processual; e era (ou não) devida a aplicada condenação em multa.

Quanto à questão da violação do dever de cooperação processual, afirmam os recorrentes que apresentaram “resposta” ao requerimento da exequente, pelo que nunca poderia o tribunal a quo ter entendido que houve, da parte dos executados apelantes, “não-resposta”, “omissão” e “silêncio”, o que apenas se deverá a lapso daquele tribunal. 

É certo que houve apresentação de um requerimento pelos executados (em 30/1/2012), na sequência da notificação do tribunal recorrido para se pronunciarem sobre o requerimento da exequente. Mas não é essa sequência formal (ou a falta dela) que estava em causa no despacho recorrido. Para não ofender a normal inteligência de um qualquer observador de boa-fé acerca da conduta processual dos executados, a única interpretação aceitável do despacho recorrido (e a única que os executados deveriam e poderiam considerar) seria a de entender que a “não-resposta”, “omissão” e “silêncio” a que o tribunal se reportava eram de natureza substantiva. Importa, por isso, verificar se o requerimento apresentado pelos executados, na sequência daquela notificação do tribunal recorrido, continha (ou não) uma “resposta” substantiva ao solicitado. 

Ao ditame do tribunal para os executados prestarem esclarecimentos sobre quem ocupava o imóvel penhorado e a que título (na sequência do pedido formulado nesse sentido pela exequente, no seu requerimento de 17/1/2012 supra indicado), apenas uma resposta seria admissível: prestarem os executados os esclarecimentos solicitados sobre essa ocupação (ou justificarem porque não dispunham de informação sobre a mesma). Ora, não é uma “resposta” ao solicitado aquilo que os executados fizeram inscrever no seu requerimento de 30/1/2012: trata-se de um requerimento – como bem se vê do seu teor, supra transcrito – no qual nada dizem sobre a referida ocupação, em que discorrem sobre outras matérias e que terminam com um pedido de indeferimento do requerimento da exequente. 

O que estava em causa era um pedido de esclarecimento da exequente que o tribunal já tinha acolhido: nada havia já a indeferir; o que havia era que prestar a informação solicitada. Os executados fizeram-se desentendidos, ignorando o que havia sido determinado pelo tribunal e nada dizendo sobre aquela ocupação do imóvel penhorado. Nisto se traduziu a “não-resposta”, “omissão” ou “silêncio” a que se referia o tribunal a quo no despacho recorrido. 

E disto os executados não poderiam deixar de ter plena consciência: não há uma “resposta” substantiva e própria quando a suposta “resposta” não tem qualquer relação lógica com a “pergunta”. Também por isso não está em causa uma qualquer violação do princípio do contraditório (contrariamente ao insinuado, já que não afirmado expressamente, pelos executados nas conclusões 12ª e 13ª das suas alegações de recurso): não havia que fazer qualquer notificação sobre a desconformidade entre a “pergunta” e a “resposta” (e sobre a possibilidade de aplicação de multa por violação do dever de cooperação), quer porque a desconformidade era notória (e, por isso mesmo, manifestamente intencional), quer porque é sabido por qualquer jurista (e também por aquele que patrocina os executados) que uma tal desconformidade se traduz em violação do dever de cooperação, a qual tem como consequência inelutável a aplicação da multa legalmente prevista.

Houve, efectivamente, uma não-satisfação da informação pretendida pelo tribunal. E, perante isso, não poderia deixar de ser qualificada a actuação processual dos executados como uma violação do dever processual de cooperação (emergente do artº 519º, nº 1, do anterior CPC, vigente à data do despacho recorrido), de que decorreria necessariamente a imposição de condenação em multa (nos termos do artº 519º, nº 2, do anterior CPC). Foi, por isso, devidamente aplicada tal sanção – e em medida que não merece qualquer reparo."
MTS