Causa de pedir; dever de consulta
1. O sumário de RC 2/6/2015 (5202/12.4TBLRA.C1) é o seguinte:
I – O âmbito da causa de pedir - que é constituída pelos factos necessários para individualizar a pretensão material alegada pela parte – determina-se através da interpretação do acto postulativo dessa mesma parte - v. g., da petição inicial – por aplicação dos critérios de interpretação dispostos na lei para os negócios jurídicos, aplicáveis, por extensão de regime, aos actos não negociais.
II - A violação, pelo tribunal, do dever de consulta – e do mesmo passo, do princípio do contraditório – resultante da apreciação de uma questão de conhecimento oficioso sem, porém, ter sido previamente dada às partes a possibilidade de sobre ela se pronunciarem, integra uma nulidade processual secundária ou inominada, que mesmo que deva considerar-se consumida por uma nulidade da sentença por excesso de pronúncia, só releva mediante arguição da parte.
III - No plano das cláusulas contratuais gerais, a boa fé é chamada como instrumento operativo e meio auxiliar da própria fixação do conteúdo admissível das cláusulas contratuais gerais, pelo que o seu imediato ponto de incidência é a estipulação contratual, em si mesma, tendo em conta as suas potencialidades aplicativas em abstracto.
IV - A cláusula contratual que, no caso de denúncia antecipada do contrato, reconhece ao predisponente o direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado, tendo em conta o quadro contratual padronizado – portanto, independentemente do contrato concreto em que se insere – é nitidamente desproporcionada em relação aos danos a ressarcir, dado que, por definição, não atende à situação patrimonial do prestador do serviço, antes e depois da extinção do contrato, procurando colmatar a diferença, como actua uma simples obrigação de indemnizar, antes se limita a atribuir, ad nutum, um preço – e um maior preço - que não encontra qualquer justificação numa prestação de serviço.
V - Tal cláusula é, pois, proibida e, como tal, nula.
2. A fundamentação do acórdão comporta o seguinte trecho:
"O pedido formulado pela parte tem de ser fundamentado, quer dizer, tem de assentar numa causa de pedir. A causa de pedir é constituída pelos factos necessários para individualizar a pretensão material alegada pelo autor, ou seja, é composta pelos factos constitutivos da situação jurídica invocada por aquela parte. Nos processos em que vigora a disponibilidade objectiva, a causa de pedir fixa os limites da cognição do tribunal (artºs 664, 2ª parte, e 668, nº 1, d) do CPC de 1961, e 5 nº 1 do nCPC);
Os factos que constituem a causa de pedir devem preencher uma determinada previsão legal, isto é, devem ser subsumíveis a uma regra jurídica: eles não são factos brutos, mas factos institucionais, isto é, factos construídos como tal por uma regra jurídica. No entanto, esses factos valem independentemente da qualificação fornecida pela parte, dado que ela não é vinculativa para o tribunal (artº 664, 1ª parte, do CPC de 1961, e 5 nº 3 do nCPC).
A causa de pedir desempenha, pois, desde logo uma função de fundamentação do pedido: o autor fundamenta o pedido numa certa causa de pedir, que fornece o porquê do pedido. O autor pede a condenação do réu a pagar-lhe a quantia X, porque lhe emprestou essa quantia ou porque ela corresponde ao preço de uma coisa que ele comprou – ou porque ela corresponde ao preço ou à remuneração de um serviço que lhe foi prestado.
O autor está, assim, vinculado a um ónus de substanciação, i.e., ao ónus de alegar, de forma substanciada, os factos que integram a causa de pedir [...]: a função de fundamentação que é realizada pela causa petendi é, assim, indispensável.
À determinação da exacta causa de pedir invocada pela parte obtém-se através da interpretação do acto postulativo dessa mesma parte - v.g., da petição inicial – por aplicação dos critérios de interpretação dispostos na lei para os negócios jurídicos, aplicáveis, por extensão de regime, aos actos não negociais (artºs 236 e 295 do Código Civil).
Assim, tendo presente que o acto da parte tem por destinatário o tribunal e a contraparte, o acto da parte deve ser interpretado de acordo com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário – o tribunal e/ou a contraparte – possa deduzir do comportamento da parte (artº 236 nº 1 do Código Civil). Em caso de dúvida séria sobre o sentido da declaração, o tribunal está vinculado ao dever de procurar esclarecimento junto da parte (artº 266 nº 2 do CPC de 1961 e 7 nº 2, do nCPC)."
Os factos que constituem a causa de pedir devem preencher uma determinada previsão legal, isto é, devem ser subsumíveis a uma regra jurídica: eles não são factos brutos, mas factos institucionais, isto é, factos construídos como tal por uma regra jurídica. No entanto, esses factos valem independentemente da qualificação fornecida pela parte, dado que ela não é vinculativa para o tribunal (artº 664, 1ª parte, do CPC de 1961, e 5 nº 3 do nCPC).
A causa de pedir desempenha, pois, desde logo uma função de fundamentação do pedido: o autor fundamenta o pedido numa certa causa de pedir, que fornece o porquê do pedido. O autor pede a condenação do réu a pagar-lhe a quantia X, porque lhe emprestou essa quantia ou porque ela corresponde ao preço de uma coisa que ele comprou – ou porque ela corresponde ao preço ou à remuneração de um serviço que lhe foi prestado.
O autor está, assim, vinculado a um ónus de substanciação, i.e., ao ónus de alegar, de forma substanciada, os factos que integram a causa de pedir [...]: a função de fundamentação que é realizada pela causa petendi é, assim, indispensável.
À determinação da exacta causa de pedir invocada pela parte obtém-se através da interpretação do acto postulativo dessa mesma parte - v.g., da petição inicial – por aplicação dos critérios de interpretação dispostos na lei para os negócios jurídicos, aplicáveis, por extensão de regime, aos actos não negociais (artºs 236 e 295 do Código Civil).
Assim, tendo presente que o acto da parte tem por destinatário o tribunal e a contraparte, o acto da parte deve ser interpretado de acordo com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário – o tribunal e/ou a contraparte – possa deduzir do comportamento da parte (artº 236 nº 1 do Código Civil). Em caso de dúvida séria sobre o sentido da declaração, o tribunal está vinculado ao dever de procurar esclarecimento junto da parte (artº 266 nº 2 do CPC de 1961 e 7 nº 2, do nCPC)."
MTS