"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



02/01/2015

Organização judiciária e competência territorial




1. O Prof. Vieira Cura publicou recentemente a 2.ª edição da sua obra Curso de Organização Judiciária (Coimbra Editora: Coimbra 2014). Para além de muitos outros méritos, a obra contém uma análise aprofundada e pormenorizada da organização judiciária instituída pela LOSJ e pelo RLOSJ.

2. Apesar de a circunscrição territorial de base ser a comarca, a organização judiciária vigente impõe que, em algumas situações, o município seja relevante para a determinação da competência territorial. Isso sucede, na opinião do Prof. Vieira Cura, em duas hipóteses.

Uma delas é aquela em que se verifica o desdobramento da instância central em duas ou mais secções cíveis. Tome-se como exemplo as comarcas de Lisboa e Porto: o tribunal judicial da comarca de Lisboa comporta duas secções cíveis, uma com sede em Lisboa e a outra com sede em Almada (art. 84.º, n.º 1, al. a) e c), RLOSJ); o tribunal judicial da comarca do Porto integra três secções cíveis sediadas uma no Porto, outra na Póvoa do Varzim e ainda outra em Vila Nova de Gaia (art. 93.º, n.º 1, al. a), c) e e), RLOSJ). A área geográfica de cada uma destas secções cíveis é um município ou um conjunto de municípios. Por exemplo: a área de competência da secção cível de Lisboa é a do município de Lisboa (Mapa III RLOSJ) e a área de competência da secção de Vila nova de Gaia é a do correspondente município (Mapa III RLOSJ).

Isto impõe que, sempre que a competência pertença a uma secção cível e, numa comarca, exista mais do que uma secção cível, haja que atender à área de competência das várias secções para determinar a secção cível que é competente. Por exemplo: o tribunal competente para apreciar a acção é o do domicílio do demandado (cf., v. g., art. 80.º, n.º 1, CPC); o réu tem domicílio em Almada; a secção cível competente é a de Almada (Mapa III RLOSJ) (ob. cit., p. 191). A mesma solução vale para o desdobramento de quaisquer outras secções de competência especializada da instância central (ob. cit., p. 206).

3. A outra hipótese em que o município releva para a aferição do tribunal territorialmente competente é aquela em que a área de competência de uma secção especializada da instância central não coincide com toda a área da comarca. Por exemplo: a secção de família e menores do tribunal de comarca de Évora não abrange, entre outros, os municípios de Estremoz e Vila Viçosa (Mapa III RLOSJ). Nesta situação, a competência para apreciar uma questão de família e menores num desses municípios pertence, em regra, à secção de competência genérica da instância local (art. 130.º, n.º 1, al. a), LOSJ) (ob. cit., p. 206 e 213). 

MTS