"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



06/02/2015

Jurisprudência constitucional (25)



Processo executivo; competência jurisdicional

TC 10/12/2014 (859/2014) decidiu o seguinte:  

"Julga inconstitucional a norma do artigo 8.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 31/94, de 5 de fevereiro, que atribui ao foro cível da comarca de Lisboa a competência para as execuções instauradas pelo IFADAP."

Na fundamentação do acórdão consta a seguinte passagem:

"A questão que se coloca, e que originou o dissídio entre os acórdãos n.ºs 90/2004 e 218/2007 relativamente a normas similares, é [...] a de saber se a norma do artigo 8.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 31/94, que declara competente o foro cível de Lisboa para as execuções instauradas pelo IFADAP por dívidas resultantes da não restituição de importâncias indevidamente recebidas a título de ajudas comunitárias, tem ou não caráter inovatório. 

Não subsiste dúvida de que uma norma como aquela que está em apreciação, cujo objeto é a determinação da jurisdição competente relativamente a certo tipo de litígios, incide sobre matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, que ao tempo da edição da norma constava da alínea q) do n.º 1 do artigo 168.º e atualmente figura na alínea p) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. 

Por outro lado, de acordo com a jurisprudência reiterada do Tribunal, para que se afirme a inconstitucionalidade orgânica não basta que nos deparemos com produção normativa não autorizada do Governo em determinado domínio onde este órgão só poderia intervir com credencial parlamentar bastante. O facto de o Governo aprovar atos normativos respeitantes a matérias inscritas no âmbito da reserva relativa de competência da Assembleia da República não determina, por si só e automaticamente, a invalidação das normas por vício de inconstitucionalidade orgânica. Desde que se demonstre que tais normas não criaram um ordenamento diverso do então vigente, limitando -se a retomar e a reproduzir substancialmente o que já constava de textos legais anteriores emanados do órgão de soberania competente, o Tribunal vem entendendo não existir invasão relevante da esfera de competência reservada. [...]

A norma, como a do artigo 8.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 31/94, que atribui competência aos tribunais judiciais para conhecer das execuções instauradas pelo IFADAP para cobrança coerciva de dívidas, é uma norma atributiva de competência específica, implicando que os litígios que passam a ser abrangidos por essa regra de competência, deixam de cair na alçada da norma supletiva, que só funcionaria se não existisse regra própria. 

E nesse sentido, o diploma emanado pelo Governo introduziu, de facto, uma alteração no ordenamento jurídico, independentemente de saber [...] se a cobrança coerciva de dívidas a pessoas coletivas públicas estava ou não já atribuída à jurisdição administrativa."