"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



10/02/2015

Jurisprudência constitucional (26)


Princípio da legalidade penal: tipicidade; reserva parlamentar;
 norma incriminadora inovatória
 
1. A parte dispositiva de TC 3/2/2015 (96/2015; também aqui) é a seguinte:

"[...] o Tribunal Constitucional declara a inconstitucionalidade [orgânica], com força obrigatória geral, da norma do artigo 97.º do Código do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 207/95, de 14 de agosto, por violação da alínea c), do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição."

A decisão tem vários votos de vencido, entre os quais o da Cons. M. de F. Mata-Mouros, do qual consta a seguinte passagem:

"[...] No quadro constitucional [...], a generalização do juízo de inconstitucionalidade da norma contida no artigo 97.º do Código do Notariado, empreendida no presente acórdão, além de se sustentar numa argumentação que traduz mera petição de princípio, dando como adquirido aquilo que devia ser demonstrado (a relevância político-criminal da norma), representa uma confusão entre os poderes jurisdicionais do Tribunal Constitucional no âmbito da fiscalização concreta e da fiscalização abstrata, que não se aceita.

A invalidação do artigo 97.º do Código do Notariado suscita ainda uma perplexidade: no momento em que é dado conteúdo jurídico útil à advertência, com a consagração do tipo penal relativamente ao qual a pessoa é advertida (o tipo penal genérico de crime de falsas declarações, como o atualmente previsto no artigo 348.º-A do Código Penal), a mesma advertência é declarada inconstitucional. Ora, esta declaração suscita interrogações adicionais, designadamente ao nível da justificação da reação penal para a incriminação dos outorgantes pelo crime de falsas declarações perante oficial público independentemente da verificação de qualquer advertência das consequências criminais da sua conduta. A uma advertência sem sanção (criminal) deverá seguir-se uma sanção criminal sem prévia advertência?"
 


2. O art. 97.º CNot dispunha o seguinte:

"Os outorgantes são advertidos de que incorrem nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações perante oficial público se, dolosamente e em prejuízo de outrem, prestarem ou confirmarem declarações falsas, devendo a advertência constar da escritura."