"[...] o inóspito, árido e descurado processo encontra-se estreitamente relacionado com as correntes espirituais dos povos e [...] as suas diversas concretizações devem ser incluídas entre os mais importantes testemunhos da cultura" (F. Klein (1902))



04/04/2016

Jurisprudência (317)


Nulidade da sentença; litigância de má fé; 
momento da condenação


1. O sumário de RC 2/2/2016 (115/12.2TBPNC.C2) é o seguinte:

I – As nulidades da sentença, taxativamente previstas no art. 615º do nCPC (tal como o anterior art. 668º, nº 1)reconduzem-se a erros de actividade ou de construção e não se confundem com o erro de julgamento (de facto e/ou de direito).

II - A comunicação para a preferência pode ser feita extrajudicialmente e o art. 416º do C.Civ. não estatui qualquer forma especial, podendo sê-lo por qualquer meio.

III - A comunicação para preferência, prevista no art. 416º do Cciv., não consubstancia uma declaração negocial, mas antes uma declaração de ciência, pelo que a forma não é requisito de validade da declaração.

IV - Comprovando-se que o obrigado à preferência enviou uma carta ao preferente, onde se identificou e explicitou as condições da venda, e que essa carta foi recebida, a circunstância de não estar assinada não invalida ou torna ineficaz a comunicação da preferência.

V - O art. 613º do nCPC deve ser interpretado no sentido de que o poder jurisdicional que se esgota com a sentença é o poder jurisdicional relativo ao mérito da causa, sobre as questões aí concretamente decididas.

VI - Não viola o art. 613º do CPC a decisão posterior à sentença que condenou o autor como litigante de má fé, após haver determinado na sentença a sua audição prévia.
 

2. Da fundamentação do acórdão consta o seguinte:

"A sentença recorrida, após afirmar que a conduta do Autor integra a litigância de má-fé, na acepção do art. 542 nº 2 a) e b) CPC, determinou a audição do mesmo, para preparar a sua defesa.

O Autor respondeu preconizando a ausência de má fé, por a carta junta não possuir qualquer valor jurídico, em virtude de não estar assinada.

Por despacho de 11/2/2015 decidiu-se condenar o Autor como litigante de má fé.

O Autor/Apelante impugna a condenação dizendo que não poderia o tribunal emitir pronúncia da má-fé posterior à sentença, por estar esgotado o poder jurisdicional, violando o art. 613 CPC.

A questão de saber se emitida sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional sobre a litigância de má fé já foi objecto de tratamento jurisprudencial.

Adere-se à corrente jurisprudencial no sentido de que não há violação do princípio do esgotamento do poder jurisdicional, com base nos seguintes tópicos:

Há autonomia da matéria da litigância de má fé, de conhecimento oficioso, e o mérito da causa, de tal forma que uma não implica necessariamente a outra;

A decisão sobre a litigância de má fé não tem de ser simultânea ou contemporânea com a sentença que conhece do mérito da causa, como, de resto, se prevê em determinadas situações (cf., por ex., arts.123, 970 nº3 CPC), e no caso de condenação na indemnização a fixar posteriormente (art.543 nº3 CPC);

Também nas situações em que se impõe a garantia do contraditório ( art. 3º CPC), a decisão sobre a litigância de má fé só pode determinar-se após tal procedimento;

O art. 613 do CPC deve ser interpretado no sentido de que o poder jurisdicional que se esgota com a sentença é o poder jurisdicional relativo ao mérito da causa, sobre as questões aí concretamente decididas, como já se vinha entendendo, mas não abrange nem inibe o juiz de resolver as questões e incidentes que surjam posteriormente e não exercem influência na sentença (cf. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol.V, pág.126 ).

Sendo assim, com a sentença o juiz esgotou o poder jurisdicional em relação ao mérito da causa, ou seja, ao exercício do direito de preferência, mas não quanto à litigância de má fé, em que se limitou a determinar a audição do Autor.

Neste contexto, verifica-se que a decisão que após audição das partes e posteriormente à sentença condenou o Autor como litigante de má fé não viola o art. 613 do CPC, nem se revela extemporânea (cf., por ex., Ac RP de 22/2/2007, proc. nº 0730581), Ac RL de 12/7/2012, proc. nº 205/06), Ac RE de 18/10/2012, proc. nº 765/08, disponíveis em www dgsi.pt )."


MTS