Recurso de revista; dupla conforme
1. O sumário de STJ (dec. sum.) 4/2/2016 (540/11.6TVLSB.L2.S1) é o seguinte:
I - Não é admissível recurso de revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, a não ser que seja caso de admissibilidade da revista excecional (art. 671.º, n.º 3, do NCPC (2013)).
II - Na interpretação da norma constante no art. 671.º, n.º 3, do NCPC, deve ponderar-se o seu elemento racional-teleológico para se concluir pela dupla conformidade de decisões, mesmo nos casos de ausência de sobreposição total, mas com decisão mais favorável para a recorrente.
III - Não ocorre diversidade essencial entre a fundamentação que serviu de suporte a ambas as decisões, se numa e noutra se decretou a resolução do contrato em causa, com fundamento na alteração anormal das circunstâncias que enquadraram a respetiva celebração, irrelevando, nesta perspetiva, o “iter” jurídico percorrido em cada caso.
2. Da fundamentação da decisão extrai-se a seguinte passagem:
"[....] O interposto recurso de revista “normal” não é admissível, atento o preceituado no art. 671º, nº 3, do CPC, nos termos do qual “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível” - o que, aqui, irreleva -, “não é admissível revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte” (Aqui se prevendo os casos em que é admissível a revista “excecional”).
Quer a sentença apelada, quer o acórdão recorrido decretaram a resolução do contrato em apreço nos autos, com fundamento em alteração anormal das circunstâncias que rodearam a respetiva celebração. Apenas divergem na fixação do momento que releva para a eficácia de tal resolução: a citação da R., no caso do acórdão, e janeiro de 2009, no caso da sentença, mas sempre com benefício para a apelante, uma vez que, interessada na subsistência do mencionado contrato, por via da apelação, “viu” a eficácia da resolução deste ser reportada, não a janeiro de 2009, mas à data da respetiva citação, necessariamente posterior, uma vez que a ação foi instaurada em 2011.
Certo, pois, que o acórdão não procedeu a uma confirmação irrestrita da sentença apelada.
No entanto, contrariamente a quem, em obediência “cega” - perdoe-se-nos a terminologia menos própria - ao elemento literal que deve ser tido em conta na interpretação normativa, sustenta que, no caso dos autos, inexiste dupla conforme, entendemos que, ponderado - como não pode e não deve deixar de ser - o elemento racional-teleológico da norma, não pode ser negada a existência daquela.
Com efeito, seria, no mínimo, absurdo que fosse, categoricamente, reconhecida a existência de dupla conforme em caso de total e integral sobreposição do segmento decisório de ambos os veredictos, e, do mesmo passo, que tal fosse negado na ausência de tal sobreposição total, mas com decisão mais favorável para a apelante. Dito de outro modo: esta última não poderia interpor recurso da decisão que suportasse a integral sobreposição e coincidência da decisão recorrida, mas já o poderia fazer, na ausência daquela sobreposição, mas beneficiando de decisão mais favorável na parte não sobreponível. Caindo-se, assim, num resultado não querido pelo legislador e que nada justifica, para além de colidente com a perspetiva que o art. 9º, nº3 do CC obriga a não esquecer.
O entendimento perfilhado pela recorrente frustra, além do mais e sem que do contrário resulte desproteção da sua posição processual, o desígnio legislativo de racionalizar a admissibilidade de recursos de revista, descongestionando e imprimindo mais celeridade ao cumprimento das demais e essenciais funções atribuídas ao Supremo.
Diga-se, finalmente, que a posição por nós perfilhada tem o expresso apoio, entre outros, do Cons. Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, pags. 287 e segs) e do Prof. Miguel Teixeira de Sousa (in “Dupla Conforme”: critério e âmbito da conformidade” - em “Cadernos de Direito Privado”, nº 21, pags. 21 e segs.), para ambos, no mais omitido e com a devida vénia, se remetendo. Salientando-se, apenas, que à Jurisprudência deste Supremo convocada por aquele primeiro autor poderão acrescer os Acs. de 12.07.11, 10.05.12, 13.02.14 e 04.06.15, todos acessíveis em www.dgsi.pt."
MTS
Quer a sentença apelada, quer o acórdão recorrido decretaram a resolução do contrato em apreço nos autos, com fundamento em alteração anormal das circunstâncias que rodearam a respetiva celebração. Apenas divergem na fixação do momento que releva para a eficácia de tal resolução: a citação da R., no caso do acórdão, e janeiro de 2009, no caso da sentença, mas sempre com benefício para a apelante, uma vez que, interessada na subsistência do mencionado contrato, por via da apelação, “viu” a eficácia da resolução deste ser reportada, não a janeiro de 2009, mas à data da respetiva citação, necessariamente posterior, uma vez que a ação foi instaurada em 2011.
Certo, pois, que o acórdão não procedeu a uma confirmação irrestrita da sentença apelada.
No entanto, contrariamente a quem, em obediência “cega” - perdoe-se-nos a terminologia menos própria - ao elemento literal que deve ser tido em conta na interpretação normativa, sustenta que, no caso dos autos, inexiste dupla conforme, entendemos que, ponderado - como não pode e não deve deixar de ser - o elemento racional-teleológico da norma, não pode ser negada a existência daquela.
Com efeito, seria, no mínimo, absurdo que fosse, categoricamente, reconhecida a existência de dupla conforme em caso de total e integral sobreposição do segmento decisório de ambos os veredictos, e, do mesmo passo, que tal fosse negado na ausência de tal sobreposição total, mas com decisão mais favorável para a apelante. Dito de outro modo: esta última não poderia interpor recurso da decisão que suportasse a integral sobreposição e coincidência da decisão recorrida, mas já o poderia fazer, na ausência daquela sobreposição, mas beneficiando de decisão mais favorável na parte não sobreponível. Caindo-se, assim, num resultado não querido pelo legislador e que nada justifica, para além de colidente com a perspetiva que o art. 9º, nº3 do CC obriga a não esquecer.
O entendimento perfilhado pela recorrente frustra, além do mais e sem que do contrário resulte desproteção da sua posição processual, o desígnio legislativo de racionalizar a admissibilidade de recursos de revista, descongestionando e imprimindo mais celeridade ao cumprimento das demais e essenciais funções atribuídas ao Supremo.
Diga-se, finalmente, que a posição por nós perfilhada tem o expresso apoio, entre outros, do Cons. Abrantes Geraldes (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, pags. 287 e segs) e do Prof. Miguel Teixeira de Sousa (in “Dupla Conforme”: critério e âmbito da conformidade” - em “Cadernos de Direito Privado”, nº 21, pags. 21 e segs.), para ambos, no mais omitido e com a devida vénia, se remetendo. Salientando-se, apenas, que à Jurisprudência deste Supremo convocada por aquele primeiro autor poderão acrescer os Acs. de 12.07.11, 10.05.12, 13.02.14 e 04.06.15, todos acessíveis em www.dgsi.pt."
MTS